O som tem a capacidade de afetar o sabor e o cheiro, tornando o café mais doce ou o vinho mais ácido. Essas são algumas das últimas descobertas de Bruno Alejandro Mesz, professor da Universidade Nacional de Três de Febrero, na Argentina, que pesquisa interações entre alimentos e música.
Uma compreensão mais aprofundada de como o cérebro processa essas sensações em conjunto pode ajudar a fornecer experiências mais ricas para pessoas com olfato ou paladar prejudicados.
Mesz descreve os sons que alteram a percepção do gosto e do cheiro como uma espécie de “tempero sônico”, que pode realçar diferentes componentes do sabor, contornando os órgãos sensoriais do paladar ou do olfato e indo mais diretamente para o cérebro.
Mesz explica que intuitivamente, tende-se a pensar que não deve haver uma transferência de sensação do som para o paladar, que o paladar independe da audição. “Mas, ao contrário, os sentidos químicos parecem ser muito suscetíveis a serem influenciados pelos outros sentidos e isso nos faz pensar sobre o quão independentes os diferentes sentidos realmente são, suas interconexões, atrações e convergências subjacentes”, esclarece.
A pesquisa de Mesz começou como uma colaboração com dois físicos da Universidade de Buenos Aires que foram atraídos pela sinestesia. “O gosto é um domínio extramusical natural a considerar em relação à música: cantamos e saboreamos com os mesmos órgãos. O gosto também tem poucas categorias básicas, por isso, é um campo ideal para explorar associações com a música empiricamente”, observou Mesz, que recentemente apresentou seu trabalho durante a terceira conferência da série de webinários Handbook of Molecular Gastronomy (HMG), contribuindo com um capítulo sobre som e gosto para o livro abrangente que cobre a ciência, a arte e a tecnologia relacionadas à alimentação.
Mesz acrescenta que uma das descobertas mais significativas é que a “geometria do gosto” parece estar relacionada à geometria da música. “Em nosso primeiro estudo, as representações musicais do ácido e do doce deram vetores quase opostos de características musicais, com um ângulo de quase 180 graus. Isso parece refletir, musicalmente, uma oposição básica desses dois gostos”.
O som também demonstrou, em alguns casos, alterar a experiência da textura, o que poderia ter aplicações para consumidores com dificuldades para engolir ou mastigar. Na verdade, muitos aspectos do som estão relacionados à textura e às sensações táteis, além de crocância e cremosidade. De acordo com Mesz, aspereza, adstringência, efervescência, maciez, dureza, umidade e secura desempenham um papel importante.
A música também pode impactar a produção de alimentos, especificamente a fermentação, que é um novo ângulo de interação música-alimento para Mesz, que viajará para a Finlândia para explorar os efeitos potenciais do som nas bactérias que fermentam queijo e iogurte.
Mesz explica que é necessário mais estudos para descobrir a interação entre som e alimento, especialmente ao procurar aplicações para deficientes sensoriais. “Se encontrarmos efeitos semelhantes para a percepção de textura, poderia ser possível fazer uma compensação sônica semelhante para dietas envolvendo limitações nas texturas dos alimentos. A tecnologia será essencial para que essas substituições sensoriais sejam mais eficazes, permitindo, por exemplo, sincronizar som e sabor, os ritmos do ato de comer, como mastigar ou engolir. Respirar e cheirar com a música também podem desempenhar um papel importante”, observa.
Mesz observa que pesquisas futuras podem investigar estímulos vibrotácteis induzidos por som no organismo. O som combinado com a textura visual da embalagem do alimento também pode alterar a experiência alimentar.
Fonte: Food Ingredients First