A qualidade sensorial dos queijos depende de uma gama de fatores que podem estar relacionados com a espécie animal, condições ambientais de produção, características químicas e microbiológicas das matérias-primas utilizadas na fabricação, ou ainda, as tecnologias aplicadas na sua fabricação.
O leite, mesmo sendo proveniente de uma mesma espécie animal, pode apresentar uma grande diferença no seu perfil físico-químico. Dentre os fatores que promovem tal variabilidade, os principais são raça, alimentação e condições sanitárias e fisiológicas do animal.
O leite proveniente de uma mesma espécie pode apresentar variações significativas na sua composição em função da raça do animal. Algumas raças produzem leite mais apto à transformação queijeira, pois possuem maior aptidão à coagulação, melhor rendimento, teor e perfil de gordura. No Brasil, as principais raças de bovino utilizadas na produção leiteira são Holandesa (Holstein), Gir, Girolando (cruzamento de Gir com Holandesa), Jersey e Pardo Suíça.
A composição do leite tem impacto direto no rendimento e na composição dos queijos, sendo ainda mais evidente quando o leite não passa pela etapa da padronização. Nesses casos, os queijos podem apresentar variações na sua composição, principalmente com relação ao teor de gordura, impactando no sabor, aroma e textura.
Alguns queijos europeus com denominação de origem protegida ou controlada (DOP ou DOC) são produzidos com leite exclusivo de uma raça determinada, tais como o queijo Roquefort, produzido com leite de ovelha da raça Lacaune, e o queijo Livarot, produzido com leite de vaca da raça Normande. Há ainda exemplos de queijos DOP ou DOC, é permitida a mistura de leite de raças específicas, porém, respeitando-se proporções pré-determinadas.
No Brasil, não existem especificações que determinem que os queijos sejam produzidos exclusivamente a partir do leite de determinada raça. Ainda assim, algumas iniciativas individuais de produtores que buscam se diferenciar no mercado propõem queijos fabricados com o leite de uma raça específica.
Uma novidade no Brasil é a produção de queijos obtidos a partir exclusivamente de leite A2A2, o qual provém de animais selecionados geneticamente para produzir leite sem a fração alergênica da β-caseína. Algumas raças, como a Gir e Jersey, tem maior aptidão genética para produzir leite sem β -caseína A1, que desencadeia a reação alérgica em pessoas sensíveis.
Os queijos podem ter suas características sensoriais influenciadas pelo tipo de alimentação recebida pelas vacas: pastagem, silagem, feno, ração ou diferentes misturas entre estes. É comprovado que o leite proveniente de animais que tenham recebido alimentação com uma maior variedade botânica produz queijos com maiores complexidade e intensidade de sabor e aroma. A alimentação também pode influenciar a coloração dos queijos, em função dos teores de gordura e carotenoides no leite.
Além disso, o tipo da pastagem das vacas tem grande influência na textura dos queijos. Leite de rebanhos alimentados em pastagens de regiões planas produz queijos mais elásticos e coesivos do que aqueles produzidos com o leite de rebanhos alimentados em pastagens de regiões montanhosas. Por outro lado, o uso de silagem de milho na alimentação das vacas está associado a queijos mais firmes e granulosos.
A especificação do tipo de alimentação oferecida aos animais faz parte da lista de exigências que deve ser cumprida para a produção de alguns queijos com DOP ou DOC. Isso porque a alimentação contribui para a diferenciação do terroir de cada região.
O leite produzido no inverno também apresenta diferenças do leite produzido no verão, principalmente em regiões muito frias, onde os animais ficam confinados durante o inverno. Alguns queijos possuem classificação em função da sua produção com leite de inverno/verão; outros somente podem ser produzidos em épocas específicas do ano para garantir que suas características sensoriais sejam preservadas.
O ambiente e tipo de alimentação animal também influenciam a diversidade da microbiota autóctone do leite. Esse efeito pode ser minimizado na produção de queijos com leite pasteurizado e fermento industrial, mas apresenta influência significativa em queijos feitos com leite cru. Os microrganismos presentes no ambiente atuam na fermentação e maturação dos queijos, promovendo características sensoriais do próprio terroir.
Em alguns casos, a alimentação pode ter impacto negativo na produção de queijos, como a utilização de silagens mal conservadas utilizadas na alimentação de bovino leiteiro, que pode acarretar defeitos tecnológicos e sensoriais nos queijos.
A presença de esporos butíricos na silagem pode causar a contaminação do leite e originar defeitos nos queijos, tais como estufamento tardio, formação de gosto e odor desagradáveis. Por isso, em alguns tipos de queijos de longa maturação, como Grana Padano e Parmeggiano Reggiano, é proibida a utilização de silagem na alimentação das vacas para mitigar esse risco.
A mastite é um dos maiores problemas sanitários da bovinocultura leiteira. Infecções microbianas no tecido das glândulas mamárias causam aumento da contagem de células somáticas (CCS) no leite. Com isso, a qualidade do leite é afetada, com alterações significativas em sua composição, tais como diminuição no teor de caseína, aumento das proteínas séricas, desbalanço salino e liberação de lipases e proteases.
Queijos produzidos a partir de leite com alta CCS têm aumento no tempo de coagulação, dificuldade de dessoragem e redução no rendimento. Além disso, esses queijos são suscetíveis a defeitos sensoriais na textura e, principalmente, no aroma e sabor. Essas alterações sensoriais são resultados da lipólise e proteólise sobre os componentes do produto, que levam à formação de sabor rançoso e/ou amargo.
O estado fisiológico do animal também pode ter impacto no leite e, consequentemente, em queijos. Queijos produzidos a partir do leite de animais no final da lactação são, frequentemente, mais úmidos e proteolisam mais rapidamente, podendo, assim, apresentar defeitos no sabor.
As características sensoriais de queijos, particularmente aqueles maturados, baseiam-se em diversos fatores, os quais podem ser de difícil controle. Portanto, os produtores de queijos enfrentam grande dificuldade para associar variações sensoriais e tecnológicas de diferentes lotes com esses fatores ambientais.
Algumas tecnologias corriqueiramente aplicadas na industrialização de laticínios, tais como a mistura de leite proveniente de diferentes rebanhos, a padronização do leite e a pasteurização, atenuam o impacto dos fatores ambientais sobre a qualidade dos queijos.
No entanto, a diferenciação de queijos pelo terroir tem gerado reconhecimento e valorização na comercialização, pois evidenciam toda sua originalidade e diversidade.
Fonte: Forlac