A celulose é uma substância naturalmente presente em plantas, frutas e vegetais. Em sua forma purificada é denominada celulose microcristalina (MCC), uma fibra insolúvel de fonte vegetal, obtida mais especificamente da madeira. Quando purificada e adicionada de hidrocoloides, mais comumente de carboximetilcelulose sódica (CMC), torna-se um ingrediente dispersível, capaz de estabilizar diversos sistemas alimentícios. Nessa forma coprocessada é conhecida como celulose microcristalina coloidal (MCC Coloidal). Produz ainda outros derivados, como a hidroxipropilcelulose (HPC), etilcelulose (CE), hidroxietilcelulose (HEC), hidroxipropilmetilcelulose (HPMC) e carboximetil-hidroxietilcelulose (CMHEC).
A celulose e seus derivados são amplamente utilizados na indústria de alimentos e bebidas, desempenhando importantes funções devido as suas propriedades de fluxo, emulsificação, estabilização de espuma, modificação da formação de cristais de gelo, crescimento e capacidade de ligação à água.
A aplicabilidade dos derivados de celulose em determinadas aplicações alimentícias pode ser selecionada em relação as características físicas e químicas. Contudo, tal seleção deve levar em consideração alguns parâmetros, como o composto químico do polímero; peso molecular do polímero; presença de outros aditivos ativos na matriz alimentar; processo de produção dos alimentos; e as propriedades físicas, incluindo o tamanho das fibras poliméricas.
A celulose microcristalina (MCC) é um dos derivados da celulose mais amplamente utilizados como aditivo alimentício. Suas dispersões coloidais exibem comportamento de fluxo tixotrópico devido a agregados em pó. As dispersões aquosas também são termicamente estáveis. É usada como um agente de volume para modificar texturas de alimentos e como um substituto de gordura em produtos alimentícios à base de emulsão. Também é um bom agente de suspensão para partículas e sólidos e adiciona cremosidade a vários produtos, como por exemplo, achocolatados. Sua adição em massas e panificados pode melhorar a aderência, reduzir o tempo de secagem e a absorção de gordura durante a fritura.
As principais funções da celulose microcristalina incluem estabilizar espumas e emulsões, substituir óleos e gorduras, melhorar a adesão em molhos, controlar a cristalização, sinérese e viscosidade e, devido as suas propriedades tixotrópicas, manter partículas em suspensão e formar géis termoestáveis. Uma das suas aplicações mais recentes é como substituto de gordura em produtos de panificação, molhos, coberturas e glacês, sobremesas geladas, produtos cárneos, frituras, sopas e alimentos estruturados.
A celulose microcristalina não é calórica e pode substituir 100% da gordura em molhos para salada, produtos lácteos e sobremesas. Sua habilidade em agir como estabilizante é particularmente útil para aplicações em formulações de baixo conteúdo de gordura.
Outras aplicações incluem queijos, molhos, temperos para saladas, sobremesas geladas e produtos lácteos, além de vitaminas e suplementos alimentícios, produtos lácteos congelados, leite aromatizado, bolos, doces e tortas e em bebidas.
Também é utilizada para substituir a manteiga de cacau em coberturas de chocolate. Uma vez na boca, a transição da gordura do estado sólido ao líquido promove liquefação, liberando o sabor e proporcionando lubrificação e sensação tátil bucal agradável. É necessário substituir a gordura da fase continua sem afetar a performance da cobertura. Os ingredientes da cobertura são dispersos em uma solução saturada de açúcar contendo celulose microcristalina. As propriedades do sistema açúcar-celulose microcristalina reproduzem as propriedades da gordura.
A celulose microcristalina pode ser encontrada sob várias apresentações, dependendo do tamanho das partículas, grau de substituição, viscosidade e características de hidratação.
As soluções de celulose microcristalina apresentam pseudoplasticidade. A viscosidade das soluções diminui com o aumento da temperatura e são estáveis na faixa de pH 3 a 11. É utilizada como espessante, estabilizante e em produtos com baixo teor de gordura, como agente de corpo.
A carboximetilcelulose (CMC) é outro derivado da celulose muito utilizado como aditivo alimentício. É solúvel em água fria, sendo sua solubilidade depende do pH; é mais solúvel em condições alcalinas e insolúvel em condições ácidas. As soluções de CMC podem ser pseudoplásticas ou tixotrópicas, dependendo do grau de polimerização, do peso molecular e do grau e padrão de substituição; soluções de carboximetilcelulose de média a alta viscosidade exibem comportamento de fluxo pseudoplástico, enquanto o mesmo tipo de solução pode exibir comportamento tixotrópico se o grau de substituição estiver entre 0,4 a 0,7 e os substituintes estiverem desigualmente distribuídos.
A carboximetilcelulose é capaz de formar géis na presença de íons metálicos trivalentes, como o alumínio. Suas propriedades gelificantes são influenciadas pela concentração de polímeros, grau de polimerização, pH, tipo e nível de cátions metálicos.
Devido ao seu caráter hidrofílico, alta viscosidade em soluções diluídas, boas propriedades de formação de filme, segurança e excelente comportamento como coloide e adesivo protetor, a CMC possui diferentes aplicações industriais. Em alimentos, é usada como agente auxiliar na agitação de sorvetes, cremes e laticínios; como auxiliar na formação de géis em gelatinas e pudins; e como espessante em molhos e recheios de saladas. Também é usada como agente de suspensão em sucos de frutas; como coloide protetor em emulsões e maionese; como agente protetor para cobrir a superfície de frutas; e como estabilizador em produtos prontos para assar. É utilizada, ainda, como agente espessante, estabilizante e agente de suspensão. Pode melhorar o volume do pão durante o cozimento, estabilizando as bolhas de gás; e estabilizar e inibir o crescimento de cristais de gelo em sobremesas congeladas e sorvetes.
A metilcelulose (MC) e a hidroxipropilmetilcelulose (HPMC) também possuem propriedades que as tornam adequadas para uso na indústria de alimentos e bebidas. Duas das suas características funcionais únicas são a solubilidade inversa da temperatura e a gelificação térmica. Os géis são formados a temperaturas elevadas devido a interações hidrofóbicas entre regiões altamente substituídas que, consequentemente, estabilizam a ligação intermolecular do hidrogênio. A firmeza dos géis de endurecimento térmico depende do grau de metilação. A metilcelulose também possui boas propriedades de formação de filme e se comporta como um verdadeiro emulsificante, pois contém grupos hidrofílicos e hidrofóbicos.
Devido às suas propriedades multifuncionais, a metilcelulose e a hidroxipropilmetilcelulose são usadas como emulsificantes e estabilizantes em molhos para salada com baixo teor de óleo e/ou sem óleo. Em produtos de panificação, evitam o transbordamento de recheios da massa e ajudam na retenção de gases durante o cozimento.
As características de formação de filme e gelificação térmica da metilcelulose são aplicadas em alimentos fritos para reduzir a absorção de óleo.
Os derivados de celulose também são utilizados em aplicações mais específicas, como em alimentos emulsionados. Muitos alimentos líquidos, como molhos, caldos, sopas e sucos, são fabricados com hidrocoloides, incluindo derivados da celulose. Especificamente nesses itens, os derivados de celulose podem auxiliar na continuidade da coletividade estrutural durante o congelamento. Além disso, podem diminuir significativamente as calorias dos alimentos, substituindo carboidratos ou gorduras. São frequentemente preferidos nesses produtos devido as suas propriedades de ligação à água e para minimizar a sinérese na desintegração, bem como para fornecerem viscosidade ao sistema alimentício, incluindo níveis reduzidos de gorduras e óleos. A hidroxipropilcelulose (HPC), a hidroxipropilmetilcelulose (HPMC) e a metilcelulose (MC) são importantes derivados de celuloseem muitos desses produtos, pois impedem a associação de gotículas de óleo, assim como garantem a viscosidade do volume e as características sensoriais desejadas em molhos e caldos.
Já os molhos para salada e coberturas batidas estão no grupo dos alimentos emulsionados, sendo o primeiro emulsões de óleo em água e o segundo espumas de emulsões de óleo em água. Ambos os tipos necessitam de propriedades químicas e físicas básicas específicas que são adquiridas com o uso de derivados de celulose.
Em geral, as emulsões de óleo e água com concentração de óleo variando de 10% a 50% são preferidas para a preparação de molhos para salada. Nesses sistemas, é significativo inibir a floculação e a coalescência do óleo, que é rapidamente eliminado. Os derivados de celulose promovem a fixidez da emulsão, concentrando-se na interface óleo/água e fornecem uma barreira de hidratação. Em molhos para salada com baixo teor de calorias, promovem a sensação de mouthfeel de molhos com óleo.
Mais comumente, as emulsões de molhos para salada são preparadas com hidroxipropilmetilcelulose (HPMC) e celulose microcristalina (MCC), sendo o HPMC incluído na mistura como emulsificante, controlador de reologia e revelador das propriedades sensoriais.
A celulose e seus derivados também são os ingredientes preferidos na fabricação de produtos assados, principalmente em produtos panificados ricos em fibras, que incluem quantidades diminuídas de farinha, devido a atenuação do valor calórico e, consequentemente, precisam de um reajuste específico para fornecer estrutura e qualidade de cozimento comparáveis aos produtos que contêm farinha de trigo. Nesses casos, a celulose microcristalina (MCC), a metilcelulose (MC) e a hidroxipropilmetilcelulose (HPMC) são utilizadas para substituição fracionária da farinha de trigo. O uso de MC e HPMC evita a perda de manutenção do pão, devido a menor concentração de farinha de trigo, garantindo uma massa elástica durante o amassamento e o cozimento, que retém o CO2 e permite manter o volume do pão de forma satisfatória.
Já na estrutura de pães, os derivados de celulose com propriedades de gelificação são muito benéficos termicamente. Como a MC e a HPMC são ativas interfacialmente, moldando géis elásticos a temperaturas elevadas, podem ser implementadas para aumentar a resistência e a aparência da massa.
Em sobremesas congeladas os derivados de celulose são utilizados para controlar o acúmulo de cristais de gelo e modificar a reologia. Também podem produzir textura em sobremesas congeladas com baixo teor de gordura ou sem gordura, com mouthfeel semelhante aos produtos que incluem níveis mais altos de gordura na sua formulação.
A metilcelulose (MC) é a mais utilizada nessa área. Em sorvetes e outros produtos ultracongelados, diminui o acúmulo de cristais de gelo durante o congelamento e o derretimento. Em maionese, especiarias, cremes e molhos, permite fixar e controlar a viscosidade da emulsão e diminuir a variedade de gordura e ovos; consequentemente, é indicada para uso em produtos alimentícios com baixo teor calórico, baixo teor de gordura e não digestibilidade. Também é indicada para promover espuma em bebidas frias e para atuar na desintegração homogênea dos vários agentes em produtos alimentícios.
Já em alimentos fritos industrializados, a metilcelulose (MC) e a hidroxipropilmetilcelulose (HPMC) são os derivados de celulose preferidos. Além de sustentarem a forma dos produtos durante a fritura, são usados para adicionar textura quando o produto está quente e para impedir a fervura durante o cozimento ou a fritura.
A metilcelulose é mais adequada para massas de alimentos fritos, devido as suas propriedades de gelificação natural e menor temperatura de gelificação. Sua alta viscosidade também é benéfica nessa área, já que a viscosidade da massa afeta o incremento de gordura durante a fritura e uma viscosidade mais alta resulta em melhores revestimentos para a massa e menor penetração de óleo.
Uma tecnologia emergente para aplicação dos derivados de celulose é no revestimento de filmes comestíveis, onde se apresentam como excelentes ferramentas para aumentar o prazo de validade dos alimentos. Por serem hidrofílicos, possuem características de formar barreira à umidade, além de fornecerem uma conservação eficiente contra a oxidação de lipídios e outros materiais alimentícios sensíveis.