Além de fonte de nutrientes com apelo sensorial, os alimentos precisam proporcionar bem-estar e saúde. Para atender a essa necessidade, tecnologias tradicionais foram implementadas com novos métodos que permitissem preservar as características originais de cor, sabor e odor do alimento, tornando-os mais bioacessíveis.
Uma das tecnologias que tem solucionado limitações no emprego de ingredientes alimentícios é o método de microencapsulação, o qual permite suprimir ou atenuar sabores e odores indesejáveis, reduzir a volatilidade e a reatividade e aumentar a estabilidade em condições ambientais adversas, como na presença de luz, oxigênio e pH extremos.
Existem muitas razões para encapsular ingredientes. De modo geral, os ingredientes são ou podem ser encapsulados por três motivos: proteger o ingrediente em si, melhorar o produto acabado como um todo, ou facilitar o processo de produção.
No primeiro caso, pode tratar-se de um ingrediente apresentando comportamento instável na presença de outros ingredientes alimentícios. As formulações microencapsuladas podem ter sua liberação controlada, sustenido ou postergada e protegem os agentes ativos sensíveis ao oxigênio durante o processo e a fase de estocagem. Muitos aromas são altamente voláteis e podem ser mais efetivamente conservados nos alimentos quando encapsulados.
A encapsulação também pode melhorar o produto acabado como um todo. Prolonga a estabilidade e, consequentemente, o shelf life do produto, permitindo que seu valor nutricional ou aroma não seja significativamente diminuído entre as datas de produção e de consumo. Pode, ainda, ser usada como meio para mascarar o aroma ou a cor de certos ingredientes, fator de suma importância em alimentos onde o flavor, aroma e aspecto visual são geralmente componentes primordiais na decisão de compra do alimento.
Por fim, a microencapsulação pode beneficiar o processo produtivo. Convertendo os materiais líquidos em cápsulas sólidas, pós ou granulados, permite a utilização de técnicas de processamento eliminando downtime em linhas de produtos ou encurtando o tempo gasto em operações de limpeza. A encapsulação pode, ainda, ser usada em casos onde é desejável a adição de um novo ingrediente em um determinado momento do processo de produção, sem ter que necessitar de novas linhas de alimentação e fases de incorporação. Para essas aplicações pode-se empregar cápsulas que serão ativadas termicamente ou por efeito de cisalhamento, aproveitando ou suscitando mudanças nas condições do processo para que seja liberado o material encapsulado.
Entre os materiais que podem ser encapsulados para aplicação na indústria alimentícia incluem-se ácidos, bases, óleos, vitaminas, sais, gases, aminoácidos, óleos essenciais, corantes, enzimas e microorganismos.
Alguns dos principais aditivos encapsulados disponíveis para a indústria alimentícia incluem acidulantes, corantes, aromatizantes e especiarias, agentes de levedação, vitaminas e minerais.
Os acidulantes são usados por vários motivos, como por exemplo, modificadores de aromas e sabores, agentes de conservação ou auxiliares de processo. Além disso, facilitam o desenvolvimento de uma grande variedade de efeitos de textura devido as suas interações com outros ingredientes, como gomas, pectinas, proteínas e amidos. Quando não encapsulados, esses ácidos alimentícios podem reagir com os outros ingredientes e produzir efeitos indesejáveis, incluindo redução do shelf life de alimentos aromatizados cítricos ou contendo amido, perda de aroma, degradação da cor, e separação dos próprios ingredientes. O uso de ácidos alimentícios encapsulados resolve esses e outros problemas, pois evitam a oxidação e proporcionam a liberação controlada, tendo invólucro formulado para dissolver-se espontaneamente ou derreter em temperatura específica. Além disso, os ácidos encapsulados reduzem a higroscopicidade, ocasionam menos sujeira e proporcionam melhor vazão no sistema sem formar grumos.
Os principais ácidos alimentícios, como o adípico, ascórbico, cítrico, fumárico, láctico e málico, são hoje disponíveis na forma microencapsulada. Três aplicações específicas se destacam nesse caso: o condicionamento de massas, o complemento de aroma, e como agente auxiliar no processamento de carnes.
O uso de ácido ascórbico (vitamina C) como agente oxidante de ação intermediaria em massa para pães tem muitos efeitos positivos no produto final. Produz uma crosta mais resistente e com cor uniforme, melhora o fatiamento e oferece ao conjunto uma resistência maior, permitindo assim a adição de outros ingredientes ricos em proteínas, como a farinha de soja, gérmen de trigo, etc.
Na prática, o ácido ascórbico sofre rápida degradação na presença de água e oxigênio e, por isso, boa parte dele já se encontra degradada antes de agir. A forma encapsulada protege o ácido desses fatores de degradação, liberando-o nas fases onde é mais necessário, ou seja, na fermentação e no cozimento.
Já o ácido cítrico usa-se para conferir ao chá um sabor ligeiramente amargo. Na forma não encapsulada, observa-se que o ácido pode reagir com certos componentes do chá, chamados de taninos, provocando a descoloração dos pacotinhos, antes mesmo de mergulhá-los para a preparação da bebida. O uso de ácido cítrico encapsulado evita essa reação, liberando o ácido somente na hora da dissolução e continuando a realçar o sabor levemente amargo.
Historicamente, os produtos cárneos curados, especialmente produtos de salsicharia secos ou semi secos, são produzidos utilizando-se o ácido láctico para produzir culturas bacterianas que desenvolverão aroma e diminuirão o pH. Frequentemente, esses produtos apresentam certa inconsist6encia de aroma, cor e textura de um lote para outro.
Os ácidos láctico e cítrico, quando não encapsulados, reagem quase que instantaneamente com a carne, tornando-a imprópria para futuro processamento. No entanto, uma alternativa para as culturas bacterianas é o uso de ácido encapsulado com liberação programada para as temperaturas das câmaras de defumação. O ácido encapsulado sempre produzirá o mesmo pH e eliminará a necessidade de fermentação, diminuindo o tempo de produção.
Já alguns corantes naturais, como o urucum, o betacaroteno e a cúrcuma, apresentam problemas de solubilidade durante seu uso. Os corantes encapsulados são mais fáceis de manipular no decorrer do processo, e melhoram a solubilidade e a estabilidade frente a oxidação. Outra vantagem que pode ser associada ao seu uso está no prolongamento do shelf life, o qual pode exceder a dois anos, comparado ao prazo de seis meses para os não encapsulados.
O campo de aplicação dos aromatizantes e especiarias é extremamente rico. Os produtos são encapsulados por uma grande variedade de processo e oferecem numerosas vantagens para os processadores de alimentos.
Em óleos cítricos e outros aromas, por exemplo, a encapsulação propicia maior estabilidade à oxidação, volatilização e luz; permite liberação controlada; oferece maior resistência à aglutinação e formação de grumos; e aumenta substancialmente o shelf life do produto final.
Produtos que apresentam reação de Maillard empregados em aromas cárneos, savoury ou de frutos do mar são altamente instáveis na forma líquida e precisam ser convertidos para uma forma sólida ou oleosa. A encapsulação confere-lhes estabilidade ainda maior.
Embora a encapsulação de aromas possa ser usada em muitas aplicações distintas, tem merecido considerável atenção por sua estabilidade em processos usando altas temperaturas por curtos períodos de tempo, como os usados na fabricação de alimentos extrusados ou preparados no micro-ondas.
Já as especiarias são encapsuladas para prolongar o shelf life, manter sua potência e inibir reações com outros ingredientes. O cinamaldeído, por exemplo, agente aromático presente na canela e que possui propriedades antimicrobianas naturais, pode retardar o crescimento de leveduras em produtos de panificação. O uso de canela na forma encapsulada proporciona aroma ao produto, porém sem interferir no processo de levedação.
Os agentes de levedação são amplamente usados em produtos de panificação e influenciam diretamente o volume e a textura.
O uso de bicarbonato de sódio encapsulado protege a massa de uma reação prematura, postergando a liberação de seu conteúdo até que sejam atingidas as condições ótimas do processo. Isso garante que seja atingido o ponto ideal de levantamento da massa e prova ser economicamente atrativo.
As vitaminas e minerais são adicionadas em misturas nutricionais secas para fortificar grande variedade de alimentos, como cereais matinais, laticínios, alimentos infantis, etc.
Tanto as vitaminas solúveis em óleo quanto em água, assim como os minerais, podem ser encapsulados com uma variedade de encapsulantes.
A encapsulação reduz o ressaibo gerado por certas vitaminas e minerais, permite a liberação gradual dos nutrientes, aumenta a estabilidade à temperatura e umidade, e diminui reações possíveis de certos nutrientes com outros ingredientes.