A valorização dos atributos de qualidade e de responsabilidade social vem crescendo significativamente no mercado mundial de alimentos. Quando se fala em alimentos de qualidade, dois aspectos devem ser considerados: os atributos do produto que atraem o consumidor, como por exemplo, as suas características sensoriais; e os atributos que o consumidor considera como pré-requisitos, como a ausência de perigos para a sua saúde. Nesse cenário, garantir a qualidade do produto passa a ser primordial para que se estabeleça uma relação entre o consumidor, o produto e o fabricante.
Órgãos específicos, sistemas de informação e mecanismos de identificação de qualidade foram criados para assegurar ao consumidor maior segurança no consumo. Esses mecanismos podem ser identificados através da rastreabilidade, dos selos de qualidade e da própria marca do produto, oferecendo ao consumidor, no ato da compra ou do consumo, um padrão mínimo de qualidade. Essas informações são fundamentadas em legislações e normas que são repassadas ao consumidor, geralmente, na embalagem do produto, contendo sua composição, técnicas de produção e origem do alimento. No ato da compra, o papel do consumidor passa a ser fundamental no que se refere a segurança, exigindo mais qualidade e garantias, como certificados confiáveis que atestem e garantam a existência de atributos de qualidade nos alimentos adquiridos; essas informações geram a sensação de que existe um controle e que o alimento é seguro para consumo.
Por trás dessas informações transmitidas ao consumidor, existe um complexo processo de garantia da qualidade realizado pelas indústrias alimentícias, que está diretamente ligado a segurança alimentar e a segurança de alimentos, itens que vem ganhando cada vez mais relevância entre os consumidores e, consequentemente, entre os fabricantes de produtos alimentícios.
Nesse contexto, é importante explicar a diferença entre os termos segurança alimentar e segurança de alimentos. O primeiro refere-se ao direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade e em quantidades suficientes. Já o termo segurança de alimentos é definido pelos Princípios Gerais de Higiene Alimentar do Codex Alimentarius como sendo o alimento que quando consumido não causará danos à saúde do consumidor. Embora os significados sejam diferentes, é clara a relação entre esses dois termos, ou seja, não pode haver segurança alimentar sem segurança de alimentos.
Contudo, a definição de alimento seguro é ampla e pode ser compreendida sob diferentes pontos de vista, sendo que as diferentes definições são dadas a partir do que constitui um risco significativo. O consumidor pode considerar que alimentos seguros significam risco igual a zero, enquanto um produtor de alimentos deve considerar o que é um risco aceitável. Infelizmente, não existe um consenso do que constitui exatamente um risco aceitável.
Todos os alimentos podem ser deteriorados entre a colheita, o processamento e a estocagem antes do consumo, sendo que a deterioração pode ocorrer devido a fatores físicos, químicos e microbiológicos.
A maioria dos métodos de conservação é elaborada para inibir o crescimento de microrganismos, prevenindo ou inibindo o crescimento microbiano. Muitos fatores podem propiciar, prevenir ou limitar esse crescimento em alimentos, sendo os mais importantes a atividade de água (aw), pH e temperatura.
Quando outras substâncias (solutos) são adicionadas à água, suas moléculas orientam-se na superfície do soluto e as propriedades da solução mudam drasticamente. A célula microbiana deve competir com as moléculas de soluto pela água livre. Com exceção do St. aureus, as bactérias são mais competidoras por água livre do que os fungos.
A atividade de água de uma solução pode interferir no efeito do calor para matar bactérias em uma dada temperatura. Por exemplo, a população de S. typhimurium é reduzida 10 vezes em 0,18 minutos a 600C, se a atividade de água do meio de suspensão for de 0,995. Se esse valor for reduzido para 0,994, são necessários 4,3 minutos, a 600C, para causar a mesma redução de 10 vezes. Um valor de atividade de água geralmente estabelece o valor mínimo em que uma bactéria pode crescer. Quando a atividade de água for mínima, o crescimento da população bacteriana será mínimo, e aumentará sempre que aumentar a atividade de água. Em valores mais baixos do que o mínimo, as bactérias não morrerão necessariamente, mesmo que isso aconteça a algumas porções de população. As bactérias que sobreviverem permanecem inativas, mas infecciosas.
A atividade de água de um alimento pode não ser um valor fixo, mudando com o passar do tempo ou pode variar consideravelmente quando se analisam alimentos similares provenientes de diferentes fontes.
A atividade de água tem sido bastante utilizada como fator de conservação de alimentos por meio da adição de sal, utilizado na conservação de carnes e peixes, ou açúcar, utilizado tradicionalmente na conservação de produtos com frutas (geleias e conservas).
É importante salientar que a atividade de água é apenas um dos fatores que devem ser considerados em alimentos, pois ainda há outros fatores importantes, como pH e temperatura, por exemplo. A inter-relação entre os fatores é que determina se uma bactéria crescerá ou não.
A faixa de pH de um microrganismo é definida pelo valor mínimo e máximo. Cada microrganismo possui um valor ótimo de pH, no qual seu crescimento é máximo.
As mudanças bruscas no pH de um alimento podem refletir na atividade microbiana. Os fracamente tamponáveis, ou seja, que não resistem a mudanças de pH, como os vegetais, podem alterar seu pH consideravelmente. Para carnes, o pH de um músculo de um animal descansado pode diferir bastante do pH de um animal fatigado.
Um alimento pode possuir, inicialmente, um pH que impeça o crescimento bacteriano, mas esse valor pode ser alterado pelo metabolismo de outros microrganismos, como mofos e leveduras, permitindo o crescimento bacteriano.
Assim como o pH, as faixas de temperatura para o crescimento microbiano possuem um valor mínimo e outro máximo, com um valor ótimo de temperatura para o crescimento máximo. O valor ótimo de temperatura de crescimento determina o grupo a que o microrganismo pertencerá, ou seja, grupo dos termófilos, dos mesófilos e dos psicrófilos. Um microrganismo termófilo não se desenvolve em temperaturas ambientes e, portanto, alimentos enlatados podem ser estocados em temperaturas ambientes mesmo que contenham termófilos que sobrevivam a processamentos com altas temperaturas.
As orientações sobre o tempo e a temperatura para a maioria dos patógenos de origem alimentar de frutos do mar foram determinadas considerando o tempo total de uma dada temperatura. Por exemplo, para controlar o crescimento de espécies de Salmonella, o alimento não deve ser exposto a temperaturas entre 5,20C e 100C durante mais de 14 dias; ou a temperaturas entre 110C e 210C durante mais de seis horas; ou, ainda, a temperaturas maiores do que 210C por mais de três horas.
Os métodos que previnem ou inibem o crescimento microbiano incluem o resfriamento, o congelamento, a secagem, a cura, processos de conserva, embalagens a vácuo, embalagens com atmosferas modificadas, acidificação, fermentação e utilização de conservantes.
Além dos métodos de conservação utilizados, a produção de alimentos seguros requer alguns procedimentos básicos, como controle da fonte, controle do desenvolvimento e do processo dos produtos, boas práticas higiênicas durante a produção, processamento, manipulação, distribuição, estocagem, venda, preparação e utilização, além de uma abordagem preventiva.
A segurança microbiológica dos alimentos é principalmente assegurada pelo controle do fornecedor, pelo desenvolvimento do produto e controle do processo, e pela aplicação de boas práticas de higiene durante a produção, processamento (incluindo rotulagem), manuseio, distribuição, estocagem, venda, preparação e uso.
A demanda por produtos alimentícios seguros leva a regulamentação de normas e processos de garantia que tem como objetivo facilitar o monitoramento e o fortalecimento da segurança dos alimentos; reforçar a garantia do direito de informação sobre segurança e qualidade dos alimentos aos consumidores; e aumentar a proteção dos consumidores contra fraudes.
Quando o assunto é garantia da qualidade, são vários os desafios para as organizações envolvidas na cadeia produtiva de alimentos, justamente porque envolve o aperfeiçoamento e monitoramento contínuo de produtos e processos, que incluem requisitos normativos, padrões estabelecidos pelo mercado e principalmente as exigências dos consumidores, os quais demandam produtos seguros e de qualidade atestada, valorizando a garantia de origem e os selos de qualidade, obtidos a partir de boas práticas de fabricação e controle de riscos, que se tornam viáveis com a aplicação dos requisitos de normas e padrões internacionais e nacionais.
Garantir a qualidade dos produtos alimentícios não deve ser uma escolha opcional ou exclusiva das grandes indústrias, mas sim uma responsabilidade de todos os elos da cadeia de alimentos.