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Quando bolores, leveduras e bactérias são desejáveis nos alimentos

Em alimentos e bebidas, leveduras, bolores e bactérias podem atuar como microrganismos benéficos ou spoilers, proporcionando resultados benéficos ou prejudiciais à qualidade e segurança de consumo.

Microrganismos podem desempenham um papel importante no processamento de alimentos, não apenas formando uma estrutura complexa da flora no processo de fermentação, mas também produzindo componentes de sabor complexos e diversos e melhorando a estrutura e a textura dos alimentos.

Os microrganismos na indústria de alimentos

Institivamente, quando se fala em leveduras, bolores e bactérias vêm à mente a contaminação de alimentos por microrganismos, o que, consequentemente, reflete em efeitos prejudiciais na qualidade de consumo do produto.

De fato, alguns microrganismos podem contaminar o alimento e causar doenças em seus hospedeiros, mas também existem os que são importantes na produção de alimentos e bebidas, influenciando beneficamente as características dos produtos para consumo humano ou animal.

Esses microrganismos são classificados como agentes produtores de alimentos (transformadores) e podem introduzidos no produto alimentício durante o seu processo de produção ou, quando ocorrem de maneira natural, é possível estimular sua multiplicação e crescimento.

Alguns dos microrganismos nos alimentos responsáveis por essas reações são as leveduras, utilizadas em bebidas (cerveja), suplementos alimentares e fermento (para pães, biscoitos, bolos, etc.); bactérias, cuja aplicação beneficia carnes (salames), vegetais (picles) e processos de fermentação do leite (iogurtes e queijos); e fungos, amplamente utilizados na fermentação (queijos) ou consumidos diretamente (champignon e shitake).

Em alimentos fermentados, bolores e leveduras desempenham papel insubstituível na formação de substâncias de sabor e na produção de componentes funcionais.

Microrganismos como bactérias, leveduras e bolores desempenham um importante papel na indústria de alimentos. Vários destes vêm sendo utilizados ao longo dos séculos e décadas como culturas naturais, culturas “starter”, culturas adjuntas e culturas de maturação para a produção de alimentos fermentados, como queijos, iogurtes, vinhos e cervejas, pães etc.”, afirma Antonio Salles, Especialista em Aplicações para Lácteos da IFF, um dos grandes players da indústria de alimentos e líder no mercado de fermentação.

Como exemplo, Salles cita o uso de culturas starter na produção de produtos lácteos, que tem como principal objetivo a formação de ácido láctico, que confere sabor e atua também como fator importante na conservação de produtos como queijos, iogurtes e leites fermentados. Por outro lado, a degradação pelos microrganismos da lactose e dos citratos presentes no leite favorecem também a formação de compostos como o diacetil e o acetato, que fornecem a alguns tipos de queijos os seus sabores característicos.

A fermentação fúngica tradicional, que leva à produção de alimentos e bebidas, é um bioprocesso antigo, mas ainda praticado em todo o mundo. As leveduras, por exemplo, estão amplamente envolvidas na fabricação de cervejas e vinhos, assim como a Penicillium spp. é usada para amadurecer queijos e carnes.

No caso da cerveja, Salles observa que as leveduras também desempenham papel essencial no processo de transformação de cereais, como a cevada maltada em álcool. “A maioria das cervejas é elaborada com água, cevada maltada e lúpulo. No processo de preparo da cerveja, as leveduras consomem os açúcares dos cereais e produzem álcool e dióxido de carbono (CO2) e também alguns ésteres, ácidos e alcoóis superiores diretamente relacionados às propriedades sensoriais da cerveja. A Saccharomyces cerevisiae e a Saccharomyces uvarum são as espécies mais utilizadas”, detalha.

Com relação a carnes, Salles menciona o salame, que é um produto cárneo fermentado e faz uso da ação de culturas de bactérias, bolores e leveduras para a sua elaboração. “Essas culturas fermentam o produto, reduzindo o pH e gerando compostos de sabor e aroma, além de contribuírem para a coloração característica desses alimentos”, complementa.

Já no universo lácteo, o iogurte e outros leites fermentados aproveitam os benefícios do uso das bactérias para a formação do sabor, proveniente da formação, principalmente, do ácido láctico; e textura, através do uso de bactérias lácticas produtoras de exopolissacarídeos que espessam alguns tipos de iogurtes. “Para outros produtos fermentados, como o Kombuchá, bebida bastante consumida mundialmente, também há alguns benefícios pela inibição do crescimento de uma flora indesejada através do crescimento de bactérias produtoras de ácido acético e leveduras que metabolizam os açúcares, formando os compostos típicos dessa bebida”, explica Salles.

Há também uma variedade de alimentos fermentados produzidos por bolores e leveduras que possuem características próprias na forma de produção, sabor e valor nutricional, de acordo com os costumes e hábitos de diferentes países ou regiões.


Atualmente, existe uma ampla gama de alimentos tradicionalmente fermentados no mundo, sejam de origem animal ou vegetal, que fazem parte da dieta diária de milhões de consumidores.

Fermentação e interação microbiana

A fermentação é um processo que ajuda a quebrar grandes moléculas orgânicas através da ação de microrganismos em moléculas mais simples. Um exemplo são as enzimas de leveduras, que convertem açúcares e amidos em álcool, enquanto as proteínas são convertidas em peptídeos/aminoácidos. As ações microbianas ou enzimáticas nos ingredientes alimentícios tendem a fermentar os alimentos, levando a alterações bioquímicas desejáveis responsáveis por significativas modificações. É uma maneira natural de melhorar vitaminas, aminoácidos essenciais, antinutrientes, proteínas, aparência dos alimentos, sabores e aromas aprimorados. Também ajuda na redução da energia necessária para o cozimento, além de tornar o produto mais seguro. Portanto, a atividade dos microrganismos desempenha papel significativo na fermentação dos alimentos, produzindo alterações nas suas propriedades químicas e físicas.

A composição dos substratos utilizados e os microrganismos fermentadores são os principais fatores de influência. Além disso, o tratamento dos alimentos e a duração da fermentação durante o processamento também afetam o processo fermentativo. Para todos os alimentos e bebidas fermentados que foram identificados, as bactérias do ácido láctico (LAB) são a microbiota dominante, considerada a parte mais crítica que contribui para efeitos benéficos nesses produtos.

Os principais microrganismos fermentadores incluem as bactérias do ácido láctico das espécies Enterococcus, Streptococcus, Leuconostoc, Lactobacillus e Pediococcus; e leveduras e bolores das espécies Debaryomyces, Kluyveromyces, Saccharomyces, Geotrichium, Mucor, Penicillium e Rhizopus.

No processo tradicional de fermentação, os microrganismos envolvidos no metabolismo são enriquecidos uniformemente em seus respectivos locais de origem para formar um sistema estrutural completo e complexo. Como o processo de fermentação tradicional é formado no ambiente natural, diferentes ambientes regionais, clima e outros fatores fazem com que o sabor dos alimentos fermentados seja diferente, assim como o papel da microflora também é diferente.

A levedura desempenha papel importante na produção de muitos alimentos fermentados. Cerca de 21 gêneros principais, com várias espécies de leveduras funcionais, foram relatados a partir de alimentos e bebidas fermentados, incluindo Brettanomyces, Candida, Cryptococcus, Debaryomyces, Galactomyces, Geotrichum, Hansenula, Hanseniaspora, Hyphopichia, Kluyveromyces, Metschnikowia, Pichia, Rhodotorula, Saccharomyces, Saccharomycodes, Saccharomycopsis, Schizo saccharomyces, Torulopsis, Trichosporon, Yarrowia e Zygosacchartztorius.

Esses microrganismos apresentam uma relação direta ou indireta com a fermentação alcoólica, álcoois superiores, ésteres, ácidos orgânicos e assim por diante, o que tem grande impacto no sabor dos produtos. Dentre elas, a Saccharomyces cerevisiae é a mais utilizada em alimentos fermentados, como pães e bebidas alcoólicas. No processo de fermentação, converte principalmente pequenos açúcares moleculares em etanol e dióxido de carbono, além de poder metabolizar uma pequena quantidade de outras substâncias de sabor. A fermentação alcoólica, por exemplo, é principalmente um processo no qual a levedura converte glicose em álcool e dióxido de carbono. A glicose produz piruvato através da via de Embden Meyerhof Parnas (EMP). O piruvato desidrogenase catalisa o piruvato em acetaldeído, que é, então, reduzido a etanol pela álcool desidrogenase. No processo, outros subprodutos também são produzidos além de álcool e dióxido de carbono, como glicerol, álcool amílico, álcool isoamílico, butanol, isobutanol e outros álcoois superiores (coletivamente referidos como óleo fúsel) e uma variedade de ésteres. O álcool possui aroma refrescante, os álcoois superiores apresentam certo sabor, e o glicerol tem sabor doce e refrescante; além disso, esses álcoois também são a premissa da formação de ésteres.

Já com relação aos bolores, existem relativamente poucos em alimentos e bebidas fermentados; estes incluem Actinomycetes, Mucor, Rhizopus, Amylomyces, Monascus, Neurospora, Aspergillus e Penicillium.

O principal papel desses bolores é produzir uma variedade de enzimas, como por exemplo, protease (ácida, neutra, alcalina), amilase, glutamidase, pectinase, hemicelulase e celulase, que podem usar amido, oligossacarídeo e monossacarídeo como fonte de carbono e proteína, e aminoácido e ureia como fonte de nitrogênio. A maltose pode efetivamente induzir a Asp. oryzae para secretar várias enzimas hidrolíticas, a Asp. oryzae para secretar α-amilase, a Asp. Níger e a Asp. nigrum para produzir glucoamilase e assim por diante. Matérias-primas amiláceas são degradadas em pequenos açúcares moleculares, como dextrina, maltose e glicose, sob a ação da amilase e da glicoamilase. Por um lado, promovem o crescimento de bactérias, leveduras e outros microrganismos, e metabolizam-se posteriormente para produzir álcoois, ácidos orgânicos e outras substâncias aromáticas. Por outro lado, alguns monossacarídeos, oligossacarídeos e polissacarídeos que não podem ser decompostos aumentam o valor nutricional dos produtos. As matérias-primas proteicas são decompostas em peptídeos, aminoácidos e outras substâncias funcionais e de sabor pela protease. Ao mesmo tempo, essas pequenas substâncias moleculares também contribuem para o crescimento e metabolismo de bactérias e leveduras.

Na produção tradicional de alimentos fermentados, não apenas os microrganismos estão intimamente relacionados ao ambiente no processo de fermentação, mas também a relação ecológica entre os microrganismos é muito complexa. O sinergismo e o antagonismo têm impacto profundo na formação do sabor final dos alimentos fermentados e na geração de novas substâncias.

Os agentes de fermentação atualmente em uso são principalmente leveduras e alguns bolores. Esses microrganismos, característicos dos alimentos fermentados, são separados e utilizados como starters para garantir a estabilidade do alimento. No entanto, os microrganismos envolvidos no processo natural de fermentação dos alimentos são em sua maioria complexos e diversos. Alguns alteram suas próprias características funcionais por meio de interações, modificando, assim, a composição de espécies e as funções no sistema microbiano em todo o sistema alimentar fermentado, o que acaba por afetar a qualidade e a segurança do alimento. Portanto, a compreensão detalhada do mecanismo da interação entre microrganismos em alimentos fermentados é um pré-requisito para otimizar e controlar a qualidade desses produtos, além de auxiliar no desenvolvimento de novos fermentos de cepas mistas, regular melhor os parâmetros do processo de fermentação e produzir alimentos fermentados estáveis.

Em geral, existem vários tipos de interações entre os microrganismos. A formação das qualidades nutricionais e sensoriais dos alimentos fermentados não depende apenas da ação de um único microrganismo, mas também da interação entre diferentes microrganismos e seus metabólitos para, finalmente, formar um alimento fermentado único...




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