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Os alimentos funcionais oferecem benefícios adicionais ou aprimorados além do seu valor nutricional básico, com prebióticos e probióticos desempenhando papel de destaque no setor. Recentemente, outro nome foi acrescentado a essa lista: os pós-bióticos, considerados como a nova era dos probióticos.
Os bióticos - Diferenças e interações
Os microrganismos do trato gastrointestinal humano constituem uma relação complexa e dinâmica que tem influência direta na saúde e no metabolismo. A microbiota intestinal age sobre uma infinidade de funções fisiológicas, frequentemente mediadas pelo sistema imunológico do hospedeiro, além produzirem uma ampla gama de compostos que podem ser usados tanto pelo ser humano quanto por outros microrganismos.
Essas interações são vitais para que exista uma simbiose microbiana do hospedeiro e o estabelecimento de comunidades estáveis promotoras da saúde. Nesse sentido, a composição da microbiota está fortemente correlacionada a uma variedade de doenças e se tornou um alvo importante para terapia e nutrição.
Com o avanço das pesquisas nesse campo, hoje se entende que a função da microbiota intestinal pode ser modulada de várias maneiras. O termo “bióticos” refere-se a estratégias nutricionais que podem ser utilizadas para direcionar a microbiota intestinal para um estado mais favorável à saúde do hospedeiro.
Os prebióticos, probióticos, simbióticos, paraprobióticos e, mais recentemente, os posbióticos, podem modular a composição da microbiota intestinal e sua atividade, bem como ter efeitos diretos na resposta imune.
Embora possam parecer semelhantes e certamente operar de maneira interconectada, existem diferenças básicas na família dos “bióticos”.
Os prebióticos e probióticos, por exemplo, são bem diferentes, apesar de oferecerem benefícios nutricionais e de saúde significativos que devem ser considerados para inclusão em novos produtos.
Os prebióticos foram definidos de uma maneira que evoluiu ao longo do tempo, em parte devido a um conflito entre a origem do termo na literatura química e sua origem na literatura médica e nutricional e, em parte, devido à natureza de expansão da descoberta ao longo do tempo. No entanto, a introdução original do conceito, em 1995, serve como uma boa base para a compreensão dos potenciais benefícios e aplicações, definindo os prebióticos como “um ingrediente alimentar não digerível que afeta beneficamente o hospedeiro, estimulando seletivamente o crescimento e/ou atividade de um ou de um número limitado de bactérias no cólon e, portanto, melhora a saúde do hospedeiro”.
Por outro lado, os probióticos são definidos pela Organização Mundial da Saúde e pela Associação Científica Internacional para Probióticos e Prebióticos como “microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem um benefício à saúde do hospedeiro”.
As evidências dos potenciais benefícios à saúde desses dois bióticos representaram um campo legítimo para expansão, em particular, com relação a perspectiva de produtos simbióticos, combinando elementos prebióticos e probióticos.
Simbióticos são alimentos ou suplementos alimentares que contêm microrganismos probióticos e ingredientes prebióticos, resultando em produtos com características funcionais dos dois grupos que, em sinergia, beneficiam o hospedeiro.
A interação entre o probiótico e o prebiótico in vivo pode ser favorecida pela adaptação do probiótico ao substrato prebiótico anterior ao consumo. Isso pode, em alguns casos, resultar em uma vantagem competitiva para o probiótico, se este for consumido juntamente com o prebiótico.
Alternativamente, esse efeito simbiótico pode ser direcionado às diferentes regiões “alvo” do trato gastrointestinal, ou seja, os intestinos delgado e grosso. O consumo de probióticos e prebióticos selecionados apropriadamente pode aumentar os efeitos benéficos de cada um deles, uma vez que o estímulo de cepas probióticas conhecidas leva à escolha dos pares simbióticos substrato/microrganismo ideais.
Os simbióticos proporcionam a ação conjunta de probióticos e prebióticos, podendo ser classificados como componentes dietéticos funcionais que podem aumentar a sobrevivência dos probióticos durante sua passagem pelo trato digestório superior, pelo fato do seu substrato específico estar disponível para a fermentação.
É amplamente conhecido que os benefícios à saúde de bactérias benéficas requerem a viabilidade dessas bactérias. Porém, estudos recentes vêm indicando que células de microrganismos não viáveis, lisados de células e outros componentes derivados de microrganismos também podem fornecer benefícios à saúde, trazendo uma bioatividade adicional aos alimentos adicionados de probióticos, por exemplo.
A partir desses estudos que sugerem que nem todos os mecanismos que geram benefícios à saúde requerem a viabilidade das bactérias, novos termos surgiram, como paraprobióticos e pós-bióticos.
O uso do termo paraprobiótico foi proposto para ser definido como células microbianas não viáveis (intactas ou quebradas) ou extratos celulares brutos (com composição química complexa), que, quando administrado (por via oral ou tópica) em quantidades adequadas, confere algum benefício ao consumidor.
Já o termo pós-bióticos refere-se a fatores solúveis (produtos ou subprodutos metabólicos) secretados por bactérias vivas ou liberados após a lise bacteriana. Esses subprodutos oferecem benefícios fisiológicos ao hospedeiro. Alguns exemplos são os ácidos graxos de cadeia curta, enzimas, peptídeos, ácidos teicóicos, endo- e exopolissacarídeos, proteínas de superfície celular, vitaminas, plasminogênios e ácidos orgânicos. Estudos indicam que os pós-bióticos possuem diferentes propriedades funcionais, incluindo propriedades antimicrobianas, antioxidantes e imunomoduladoras.
Os prebióticos, probióticos, simbióticos, paraprobióticos e, mais recentemente, os pós-bióticos, estão ganhando cada vez mais espaço no mercado, incorporando benefícios funcionais de uma maneira mais holística.
Juntos, os “bióticos” são uma promessa no mercado global, impulsionados por sua aplicação em alimentos, bebidas e suplementos.
Somente o mercado global de pós-bióticos foi responsável por US$ 40,51 bilhões em 2020, e está estimado em US$ 83,30 bilhões até 2030. América Latina, América do Norte, Leste Asiático, Europa, Oceania, Sul da Ásia e Oriente Médio e África são regiões-chave com presença do mercado global de suplementos pós-bióticos. Entre todas as regiões, a América do Norte é uma das regiões dominantes nesse mercado.
Já o mercado global de probióticos deverá atingir US$ 61,95 bilhões em 2022, chegando a US$ 66,04 bilhões até 2024 e a US$ 111,21 bilhões em 2030, apresentando uma taxa de crescimento anual composta de 7,5% de 2021 a 2030, impulsionado por alimentos e bebidas, destacando-se nessa categoria, os produtos lácteos, que dominam a participação majoritária, sendo o iogurte e as bebidas à base de iogurte os mais consumidos.
Na esteira de crescimento também estão os prebióticos, com previsão de atingir US$ 7,91 bilhões até 2025. Impulsionado pela demanda por suplementos prebióticos e, cada vez mais, ingredientes prebióticos em alimentos e bebidas, o setor continua a ser uma aposta sólida, nomeadamente com a acessibilidade dos produtos lácteos, que deverá potenciar o desenvolvimento do segmento.
Um passo além dos pré e probióticos
De forma resumida, os pós-bióticos são obtidos a partir da fermentação dos probióticos, de modo que podem ser considerados como um subproduto deles. Quando fermentados e alimentados com moléculas fibrosas, os probióticos originam os pós-bióticos, cujas propriedades são capazes de ajudar na regulação do microbioma intestinal.
O intestino possui um sistema imune próprio, que se comunica com o restante do organismo. Para que o intestino esteja saudável são necessários probióticos (bactérias vivas benéficas), prebióticos (fibras que alimentam essas bactérias benéficas) e pós-bióticos (substâncias produzidas pelas fibras a partir da fermentação das fibras prebióticas).
Os pós-bióticos são as substâncias produzidas pelas bactérias e incluem enzimas, peptídeos, ácidos graxos de cadeia curta e polissacarídeos, entre outras. Possuem atividades anti-inflamatórias, imunomoduladoras, anti-obesogênicas, anti-hipertensivas, hipocolesterolêmicas, antiproliferativas e antioxidantes. Essas propriedades sugerem que os pós-bióticos podem contribuir para a melhoria da saúde do hospedeiro, melhorando as funções fisiológicas.
Embora o conceito de pós-bióticos seja relativamente novo, já existem há muito tempo e foram associados a vários benefícios à saúde, principalmente ao fortalecimento do sistema imunológico.
Os pós-bióticos têm sido associados principalmente a atividades imunomoduladoras, pois desempenham papel na estimulação do sistema imunológico inato e adaptativo, mantendo a integridade da barreira da mucosa intestinal e antagonizando patógenos com compostos antimicrobianos, como os efeitos dos probióticos.
Potenciais mecanismos e benefícios dos pós-bióticos na modulação do sistema imunológico
Os pós-bióticos incluem qualquer substância liberada ou produzida pela atividade metabólica do microrganismo que exerça efeito benéfico sobre o hospedeiro, direta ou indiretamente.São a mistura complexa de produtos metabólicos secretados pelos probióticos em sobrenadantes livres de células, como enzimas, proteínas secretadas, ácidos graxos de cadeia curta, vitaminas, biossurfactantes secretados, aminoácidos, peptídeos, ácidos orgânicos e outras células microbianas inativadas de probióticos (intactos ou rompidos, contendo componentes celulares como peptidoglicanos, ácidos teicóicos, proteínas de superfície, etc.) ou extratos celulares brutos (ou seja, com composição química complexa) de pós-bióticos e parabióticos. Estes trazem várias vantagens sobre os probióticos, como disponibilidade em sua forma pura; facilidade na produção e armazenamento; disponibilidade do processo de produção para escala industrial; mecanismo específico de ação; melhor acessibilidade do Padrão Molecular Associado a Microrganismos (MAMP) durante o reconhecimento e interação com Receptores de Reconhecimento de Padrão (PRR); e, provavelmente, desencadeia apenas as respostas direcionadas por interações ligante-receptor específicas.
Além de fornecer benefícios à saúde, os pós-bióticos mostram vantagens em comparação aos probióticos. Não são vivos, portanto, são mais estáveis e possuem uma vida útil mais longa do que os probióticos ativos. Também não exigem condições estritas de produção ou armazenamento para mantê-los vivos, tornando-os adequados para países em desenvolvimento que têm acesso inconsistente, por exemplo, à refrigeração.
Características dos Pós-Bióticos
A produção pós-biótica é alcançada pela inativação de microrganismos probióticos. No entanto, ressalta-se que o método de inativação aplicado para a produção de pós-bióticos deve ser capaz de preservar os efeitos benéficos proporcionados pela forma viva. Nesse sentido, foi indicado que pode ser produzido/obtido usando diferentes métodos de inativação, incluindo sonicação, processos enzimáticos, extração por solvente e produtos químicos (por exemplo, formalina) em níveis laboratoriais e industriais. Diante dessa situação, os tratamentos térmicos são os métodos mais utilizados para inativar microrganismos probióticos. A temperatura e a duração da inativação pelo calor diferem dependendo das características dos microrganismos (por exemplo, célula vegetativa ou esporos, meio de crescimento, estágio de crescimento, atividade de água, etc.).
A eficácia pós-biótica é baseada nos metabólitos microbianos, proteínas, lipídios, carboidratos, vitaminas, ácidos orgânicos, componentes da parede celular ou outras moléculas complexas que são geradas na matriz fermentada quando estão sendo preparados esses componentes.
Do conceito à aplicação
Na indústria alimentícia, a viabilidade dos probióticos é um dos parâmetros-chave no desenvolvimento de produtos probióticos. A eficácia para a saúde dos alimentos probióticos depende do número de células viáveis e ativas por grama ou mililitro no momento do consumo. Os principais fatores que afetam a estabilização dos probióticos nos alimentos são as condições de fermentação (pH e acidez, temperatura e oxigênio); matriz alimentar (pH, acidez titulável, oxigênio, atividade de água, presença de sal, etc.); microencapsulação; aditivos; processamento de alimentos (secagem, congelamento e descongelamento); e condições de embalagem e armazenamento. Por exemplo, o suco fortificado com probióticos pode apresentar reduções significativas na contagem de bactérias viáveis durante o armazenamento devido à sua alta acidez. Considerando esses fatores, os pós-bióticos oferecem vantagens terapêuticas e tecnológicas para os fabricantes de alimentos sobre os probióticos para uso industrial.
Além das vantagens terapêuticas, alguns pós-bióticos também são utilizados por suas funções tecnológicas que afetam positivamente as propriedades físico-químicas e sensoriais do produto final, proporcionando melhor estabilidade, textura e sabor.
Produtos que contêm probióticos e pós-bióticos já estão ganhando força no mercado. Mas além dos benefícios de saúde diretos na microbiota e de fornecer características organolépticas desejadas nos alimentos, os pós-bióticos podem ser de extrema importância para a segurança alimentar, garantindo menor crescimento de patógenos em diversas matrizes alimentares.
Atualmente, é de conhecimento geral que os probióticos vivos, que incluem muitas cepas de bactérias do ácido láctico (LAB), proporcionam muitos benefícios à saúde devido ao seu consumo contínuo e colonização da microbiota intestinal. Entretanto, esses microrganismos podem alterar as características físico-químicas, microbiológicas e sensoriais do alimento inoculado. Algumas vantagens da adição de probióticos aos alimentos são sua interação com bactérias patogênicas, pois os probióticos podem reduzir o crescimento de patógenos pela competição por nutrientes ou pela secreção de substâncias antimicrobianas. As substâncias antimicrobianas secretadas por bactérias probióticas podem ser reconhecidas como pós-bióticas e podem ser extremamente importantes para a segurança alimentar, garantindo um menor crescimento de patógenos nos alimentos e melhorando a saúde dos consumidores.
Embora as bactérias do ácido láctico com características antimicrobianas apresentem várias vantagens potenciais sobre antibióticos e conservantes químicos, sua aplicação em alimentos também encontra alguns problemas. O desafio para o uso direto de culturas vivas em produtos alimentícios é a compatibilidade de crescimento e sobrevivência de tal cultura inicial em diferentes matrizes alimentares e ambientes. Nesse sentido, para fins antimicrobianos, a adição direta da mistura de pós-bióticos, ou pós-biótico individual, evita as interações negativas entre os iniciadores primários e adjuntos vivos. No entanto, existem alguns obstáculos no uso de pós-bióticos individuais de culturas iniciadoras e protetoras. Os metabólitos antimicrobianos são compostos de espectro estreito e patógenos tratados com alguns deles, incluindo bacteriocinas, que podem desenvolver resistência, apesar do alto custo de isolamento e purificação de bacteriocinas. No caso da mistura de pós-bióticos, os alimentos podem aproveitar ao máximo a atividade antimicrobiana de amplo espectro, bem como as atividades sinérgicas entre ácidos orgânicos e outros metabólitos, além da alta estabilidade térmica da mistura de pós-bióticos.
O pós-biótico individual possui muitas funções de segurança alimentar bem conhecidas e emergentes na biopreservação e embalagem de alimentos, controle e erradicação de biofilme de patógenos de origem alimentar, biodegradação de contaminantes químicos nocivos, entre outras. A eficácia dos pós-bióticos nos sistemas alimentares depende da cepa de bactéria ácido láctica a partir da qual o pós-biótico é preparado; do tipo de microrganismo ou contaminante alvo; da concentração e forma de aplicação; e do alimento, ou seja, características da matriz.
Entre as aplicações potenciais dos pós-bióticos em diversas matrizes alimentares com o objetivo de garantir a segurança alimentar está a biopreservação de alimentos, uma nova abordagem que é aplicada para estender a vida útil e prevenir a deterioração microbiana de alimentos usando microrganismos específicos (culturas primárias e secundárias) e seus metabólitos antimicrobianos, ou seja, ácidos orgânicos, peróxido de hidrogênio, bacteriocinas, etc.
Dado os altos níveis de contaminação microbiana, os alimentos de origem animal representam as commodities alimentares ideais para a aplicação de pós-bióticos. Carnes, peixes e produtos afins são altamente suscetíveis à contaminação bacteriana, causando redução das suas propriedades nutricionais, alterações organolépticas indesejáveis e uma ameaça à saúde do consumidor. Os pós-bióticos contêm compostos antimicrobianos para uso em carnes e produtos cárneos que podem ser aplicados diretamente no produto por métodos de revestimento e spray, dependendo da natureza dos pós-bióticos e do tipo de carne. Por exemplo, em peixe moído e carne, os métodos de adição direta e pulverização são preferíveis, enquanto o revestimento é recomendado para filé de peixe e fatias de carne.
Os pós-bióticos de algumas culturas probióticas também podem regular negativamente a expressão gênica de alguns fatores virulentos, ou seja, enterotoxinas e enzimas, em patógenos de origem alimentar multirresistentes sem exibir atividade antagônica, sendo essa capacidade um fenômeno específico da cepa.
A atividade inibitória dos pós-bióticos sobre a microbiota alimentar e os patógenos está principalmente relacionada à quantidade e tipo de pós-biótico individual antimicrobiano ativo. As concentrações mínimas efetivas (MECs) de pós-bióticos também variam dependendo de vários fatores, como por exemplo, sistemas alimentares e tipo de bactérias do ácido láctico. O índice MEC revela a concentração mínima de AA para prevenir o crescimento de microrganismos no alimento. Geralmente, índices MEC mais baixos foram relatados em modelos alimentares em comparação com in vitro, destacando a importância de testar o desempenho de pós-bióticos na matriz alimentar.
Segundo vários estudos, os pós-bióticos também podem ser usados como aditivos antimicrobianos para controlar o crescimento de microrganismos deteriorantes na carne.
Em produtos lácteos, embora estes sejam considerados veículos tradicionais de entrega de probióticos aos consumidores, alguns fatores intrínsecos e extrínsecos podem afetar negativamente a viabilidade das cepas probióticas durante o processamento e armazenamento. Alternativamente, os pós-bióticos e os pós-bióticos individuais possuem propriedades benéficas, servindo como agentes de biocontrole para a garantia da segurança dos produtos lácteos.
Vale ressaltar que, em estudos, ao contrário dos produtos cárneos, a coloração marrom a amarelo-acastanhada dos pós-bióticos preparados com cultura sintética pode restringir a utilização de pós-bióticos, especialmente em concentrações mais elevadas em muitos produtos lácteos, exceto o aqueles com aparência de cor marrom a amarela primária, como doce de leite, bebidas lácteas com chocolate e sobremesas lácteas. Assim, no caso de produtos lácteos, o pós-biótico individual é geralmente preferível à mistura de pós-bióticos.
Devido à natureza branca, líquida e opaca do leite, alguns aditivos podem causar alterações aparentes na cor e aparência. A solução é usar meios alternativos para a preparação de pós-bióticos ou descolori-los antes do uso em produtos lácteos. Um estudo teve como objetivo usar pós-bióticos preparados a partir de três bactérias do ácido láctico em leite de baixa temperatura e permeado de leite em escala piloto como ingrediente antifúngico para inibir o crescimento de deterioração fúngica em creme azedo e queijo semiduro. Os pós-bióticos reduziram significativamente a população fúngica do queijo sem afetar a aceitação sensorial, enquanto os pós-bióticos nas concentrações de 2% e 5% (p/p) tiveram efeitos negativos nos atributos sensoriais do creme azedo. Os autores propuseram que a pulverização superficial de pós-bióticos na amostra de queijo pode servir como alternativa eficiente para o composto antifúngico natamicina.
As frutas e hortaliças podem se beneficiar da atividade antagônica dos pós-bióticos, sendo que os pós-bióticos de bactérias do ácido láctico podem ser usados na forma de solução, como um desinfetante de lavagem na indústria minimamente processada. Nesse caso, a combinação de pós-bióticos com diferentes AAs, especialmente os naturais, pode aumentar a atividade biológica geral dos pós-bióticos. Um exemplo é a solução combinada de extrato de semente de uva e pós-bióticos, que pode atuar como uma alternativa natural segura para sanitizante à base de cloro para descontaminação microbiana de vegetais. Os pós-bióticos também podem inibir o crescimento de patógenos de origem alimentar em sucos de frutas.
A capacidade antifúngica dos pós-bióticos também foi pesquisada em panificados, por pulverização de pós-bióticos nas superfícies de pão. Os pós-bióticos de Lactobacillus reuteri impediram a contaminação por fungos por 15 dias, armazenados a 25°C, e melhoraram a textura do pão.
A capacidade dos pós-bióticos de Lactobacillus produtor de antifúngicos de atuar na produção de aflatoxinas Aspergillus em grãos de trigo também foi estudada. O crescimento fúngico foi completamente inibido e a vida de prateleira dos grãos foi estendida por 15 dias. Da mesma forma, pós-bióticos de diferentes cepas de Lactobacillus retardaram o crescimento fúngico e prolongaram a vida útil de queijo processado, pão comercial e purê de tomate durante o armazenamento a 40C e 300C.
Produção in situ de pós-bióticos em alimentos
Ao invés da adição direta de pós-bióticos no leite, a produção in situ de pós-bióticos por bactérias do ácido láctico mostrou importante atividade antilisterial no leite em condições refrigeradas. Em um extenso estudo, os pesquisadores examinaram o potencial de algumas culturas bioprotetoras na produção de metabólitos antifúngicos, como por exemplo, ácidos orgânicos, ácidos graxos livres e compostos voláteis, em creme azedo, iogurte, queijo modelo e queijo semiduro. Os autores propuseram o papel da matriz alimentar e do tipo de cultura na qualidade e quantidade de metabólitos antifúngicos produzidos por culturas protetoras.
Os EPS de bactérias do ácido láctico apresentam atividade antimicrobiana sobre diversos patógenos de origem alimentar e microrganismos deteriorantes, destacando sua importância como aditivos naturais para aplicações de segurança alimentar. Geralmente, os EPS de cepas de bactérias de ácido láctico únicas exibem atividade antimicrobiana moderada a forte em condições in vitro. Os EPS também são produzidos in situ durante a fermentação dos iogurtes, os quais interagem com os compostos alimentares, melhorando suas propriedades de texturização. A redução da “umidade na substância desnatada”, que ocorre normalmente em queijos com baixo teor de gordura, afeta a textura. Em tais queijos, o EPS pode atuar alternativamente para melhorar a textura e as propriedades de cozimento sem afetar as características sensoriais do queijo. Vale ressaltar que apenas uma bactéria do ácido láctico produtora de EPS encorpado pode apresentar os efeitos positivos mencionados, enquanto cepas produtoras de EPS capsular não podem.
As cepas de bactérias do ácido láctico têm sido usadas para a produção in situ de EPS em matrizes de carne, o que pode melhorar a capacidade de retenção de água e as propriedades texturais e microestruturais dos produtos cárneos. Alternativamente, o EPS pode ser isolado e usado como bioaditivo alimentar, que também pode exibir atividade antagônica sobre patógenos de origem alimentar e microrganismos deteriorantes se adicionados diretamente ao produto alimentício. Consequentemente, todos os processadores, varejistas e consumidores podem se beneficiar desta especificação para garantir a segurança do produto.
Adequação às legislações
Em 2019, a Associação Científica Internacional de Probióticos e Prebióticos (ISAPP) convocou um painel de profissionais especializados em nutrição, fisiologia, gastroenterologia, pediatria, ciência dos alimentos e microbiologia com o objetivo de revisar a definição e o escopo dos pós-bióticos, considerando os avanços científicos, comerciais e regulatórios relacionados a esse termo.
Nesse painel, o conceito de pós-biótico foi redefinido como sendo uma "preparação de microrganismos inanimados e/ou seus componentes que confere um benefício para a saúde do hospedeiro”. No painel também foram discutidas as evidências existentes dos efeitos dos pós-bióticos na promoção da saúde, seus mecanismos de ação, evidências científicas e segurança.
Entretanto, nenhuma agência regulamentou o uso de pós-biótico ou determinou parâmetros para alimentos ou suplementos alimentares contendo pós-biótico.
Por outro lado, em alguns países já é possível verificar um avanço nas formulações pós-bióticas para aplicações nas áreas médicas ou farmacêuticas. No Japão, não há registro de reivindicação de nenhum produto alimentar pós-biótico para FOSHU (Food for Specified Health Uses), que é um termo criado no país para alimentos comprovadamente funcionais destinados a pessoas que buscam melhorar a saúde e recebem este termo estampado em sua rotulagem. Para ser aprovado como um alimento FOSHU, a segurança microbiológica e a efetividade na promoção da saúde devem estar comprovadas e aprovadas pelo Ministério da Saúde.
Na União Europeia (UE) não há nenhum regulamento específico a respeito de probióticos, prebióticos, simbióticos ou pós-bióticos, mas há uma lista constantemente atualizada de microrganismos que atendem aos critérios de segurança para uso em alimentos, permitindo que bactérias e leveduras sejam usadas como microrganismos precursores para pós-bióticos.
Para preparações farmacêuticas e medicamentos, há o regulamento da UE2017/745, que apresenta os critérios e níveis máximos permitidos de microrganismos. Na América do sul, o Brasil é o país mais avançado a nível de regulamentação, pois publicou em 1999 um regulamento técnico que estabelece critérios básicos para análise e comprovação de propriedades funcionais ou de saúde alegadas em rotulagem de alimentos.
Em seguida, vem aArgentina, que fez o mesmo em 2011, e Chile em 2017, onde, apesar de não especificarem o termo pós-biótico, autorizaram a comercialização de alimentos funcionais com evidências científicas aplicáveis à comprovação da alegação de propriedade funcional e ou de saúde, o que englobaria os pós-bióticos.
Nos Estados Unidos, a FDA não regulamentou especificamente os pós-bióticos, mas podem ser incluídos nos regulamentos da categoria dos probióticos. Para isso, a segurança, eficácia e finalidade precisam atender aos padrões da categoria a que pertencem. Assim, se um pós-biótico for utilizado em alimentos, precisará ser aprovado como aditivo alimentar após a avaliação de especialistas e receber o reconhecimento como GRAS (Generally Recognized As Safe).