Tradicional inovador no agronegócio e respeitado globalmente na área de pesquisas de materiais, o Brasil está começando a colher os primeiros resultados concretos no desenvolvimento de produtos criados pelo cruzamento desses dois campos do conhecimento, usando sobretudo a nanotecnologia.
Seis empresas assinaram contratos e pelo menos duas delas pretendem lançar até o meio do ano que vem novidades desenvolvidas pela Rede AgroNano (Rede de Nanotecnologia para o Agronegócio). Entre elas, estão embalagens que “amadurecem” com as frutas, snacks altamente nutritivos feitos de alimentos desprezados e um hidrogel que otimiza o uso de água e fertilizantes na agricultura. “Trabalhamos com materiais que têm sensores e propriedades que mudam de acordo com os estímulos que recebem do meio ambiente”, diz Caue Ribeiro, pesquisador da Embrapa Experimentação e coordenador da Rede AgroNano. “É a fronteira futura dos materiais, aplicada ao agronegócio.”
É exatamente isso o que fazem os nanosensores colocados em tinta de imprimir e aplicados em etiquetas coladas em frutas: mudam de cor ao medir a concentração de gás etileno, emitido em maior ou menor intensidade por caquis, peras e bananas, dependendo de sua maturação. Assim, enquanto o adesivo colado numa fruta estiver roxo, ele estará indicando que ela ainda não está madura. Conforme for mudando para um tom mais acinzentado está boa para o consumo e, totalmente cinza, apodrecida. “Estamos trabalhando neste momento na escala de cores”, diz Ana Elisa Siena, sócia da Siena Idea, consultoria que faz a ponte entre centros de pesquisa e empresas. “E também num aplicativo que lerá essa escala com precisão e indicará os melhores usos para uma fruta mais ou menos madura.”
Com o protótipo em mãos, o próximo passo será testá-lo numa parceria com um grande produtor, de preferência de caquis, por causa do custo. Apesar de a etiqueta custar centavos, ela pode não valer à pena no caso de uma fruta muito barata, como bananas. Depois de calibrado o produto, Ana Elisa pretende desenvolver uma variação para outras frutas que não sejam as chamadas climatéricas, emissoras de etileno na maturação. “Inicialmente pensamos em desenvolver essas etiquetas para os produtores de fruta, mas percebemos que ela deverá interessar também ao varejo e aos exportadores”, afirma.
No ano que vem também deverá chegar ao mercado o primeiro produto que usará os filmes biodegradáveis feitos de alimentos, desenvolvidos pela Embrapa. São nanobiosnacks de frutas, muitas vezes desprezadas pelo varejo ou pela indústria por terem imperfeições e com valor nutricional potencializado com nanonutrientes. Ainda sem nome comercial, será uma espécie de chip de batata frita (sem a fritura, claro) e está sendo feito em parceria com a Funcional Mikron, especializada em nanotecnologia para alimentos, fármacos e cosméticos. A empresa pertence ao mesmo grupo da Alibra Ingredientes, fornecedora da indústria alimentícia e Ultrapan, fabricante do suco Tampico e do energético Power Bull. “A originalidade do snack é ir ao encontro do que muitos jovens gostam e comem”, diz Eduardo Carità, diretor de tecnologia e inovação da Funcional Mikron.
Com grande potencial de múltiplos usos, os filmes biodegradáveis ainda estão no começo de sua exploração. Originalmente, a Embrapa acreditava que eles poderiam interessar à indústria de embalagens, por serem totalmente consumíveis e 100% biodegradáveis. “Nosso maior desafio, depois que a pesquisa é feita, é encontrar empresas interessadas em continuar a desenvolver soluções comerciais para a matéria-prima resultante das pesquisas”, afirma Ribeiro.
Um deles é um nanocomposto à base de hidrogel, a mesma substância que absorve líquidos em fraldas e absorventes. Seu uso na agricultura tem grande potencial, uma vez que os nanogrãos podem armazenar água e controlar a saída de nutrientes. Assim, poderá evitar casos de quebra de safra por estiagem ou reduzir custos pela diminuição do uso de mão de obra. No momento, uma indústria química paulista negocia com a Embrapa um acordo para sua produção. “Testamos em culturas de tomate e pimentão e os resultados foram animadores”, diz. “Como a absorção é muito grande, usamos volumes pequenos de nanocompósitos, de cerca de 1% em relação aos nutrientes, o que aumenta a viabilidade do sistema.”