Nutrição para a longevidade: a revolução dos ingredientes senolíticos e ativadores de sirtuínas

O setor de alimentos funcionais está prestes a cruzar uma nova fronteira, movendo-se do bem-estar geral para uma meta muito mais ambiciosa: a otimização da saúde a nível celular e a extensão do "healthspan", o período de vida com saúde. No centro desta revolução estão os ingredientes com potencial senolítico e os ativadores de sirtuínas, antes confinados a laboratórios de biotecnologia e que agora batem à porta da indústria alimentar. A partir deles, novas possibilidades se abrem para que a alimentação seja um caminho ainda mais potencializado para alcançar a longevidade.
Um novo campo aberto
Durante décadas, a indústria de ingredientes focou-se em benefícios de saúde macroscópicos: saúde cardíaca, digestiva, imunológica. Hoje, a conversa está tomando um novo rumo para o próprio motor do envelhecimento. Impulsionado por avanços na gerociência (a ciência do envelhecimento) e por um consumidor cada vez mais informado e disposto a investir na sua saúde a longo prazo, emerge um novo mercado: a nutrição para a longevidade.
Este mercado já movimenta valores impressionantes. Segundo um relatório da Boston Consulting Group (BCG), o mercado global de longevidade e "anti-envelhecimento", que engloba desde suplementos a biotecnologia, já é avaliado em mais de 250 mil milhões de dólares e poderá chegar a 610 mil milhões de dólares até 2025. Embora a suplementação ainda domine, a transição destes compostos para alimentos e bebidas funcionais do dia a dia é vista como o próximo passo lógico e lucrativo.
O "lixo" celular: entendendo as células senescentes
Com o tempo, algumas células do nosso corpo entram num estado de "reforma", conhecido como senescência. Elas deixam de se dividir, mas não morrem. Em vez disso, permanecem no corpo, libertando um cocktail de moléculas inflamatórias (conhecido como SASP - Fenótipo Secretor Associado à Senescência) que pode danificar as células vizinhas saudáveis. A acumulação destas "células zombies" está associada a várias doenças relacionadas com a idade.
É aqui que entram os senolíticos: compostos que, segundo estudos pré-clínicos, conseguem induzir seletivamente a morte (apoptose) destas células senescentes, ajudando a "limpar o terreno" e a reduzir a inflamação crónica de baixo grau.
Os ingredientes mais promissores nesta categoria incluem:
- Fisetina: um flavonoide encontrado em morangos, maçãs e cebolas. Um estudo seminal publicado na revista EBioMedicine pelo Scripps Research Institute e pela Mayo Clinic em 2018 demonstrou que a fisetina reduziu a carga de células senescentes e prolongou a vida de ratos idosos.
- Quercetina: outro flavonoide abundante em maçãs, alcaparras, cebola roxa e chá verde. Frequentemente utilizada em combinação com o fármaco dasatinibe em ensaios clínicos, a quercetina é um dos senolíticos naturais mais estudados.
Sirtuínas: os "guardiões" do genoma
As sirtuínas são uma família de sete proteínas essenciais importantes na regulação do metabolismo, na reparação do ADN e na resistência ao estresse celular. A sua atividade, no entanto, tende a diminuir com a idade. Ativá-las é um dos principais focos da investigação em longevidade.
Os ingredientes que ativam as sirtuínas dependem de um co-fator essencial, o NAD+ (dinucleótido de nicotinamida e adenina), cujos níveis também decaem com o envelhecimento. Os compostos mais notáveis são:
- Resveratrol: o famoso polifenol encontrado na casca das uvas tintas, amendoins e mirtilos. Tornou-se célebre através de estudos da Harvard Medical School que o associaram à ativação da sirtuína SIRT1, imitando os efeitos da restrição calórica.
- Precursores de NAD+ (NR e NMN): o Ribosídeo de Nicotinamida (NR) e o Mononucleótido de Nicotinamida (NMN) são formas da vitamina B3 que o corpo utiliza para produzir NAD+. O mercado de suplementos de NR e NMN explodiu, com a empresa ChromaDex, detentora da patente do NR (Niagen®), a reportar um crescimento constante nas suas receitas ano após ano.
O mercado: dados e projeções
A oportunidade comercial é uma realidade. A MarketsandMarkets, uma empresa de pesquisa de mercado, projeta que o mercado global de ingredientes "anti-envelhecimento" (uma categoria que engloba estes novos compostos) crescerá a uma taxa anual composta (CAGR) de 7.8% entre 2023 e 2028.
Já o mercado global de resveratrol foi avaliado em cerca de 110 milhões de dólares em 2024 e espera-se que continue a crescer, impulsionado pela sua aplicação em suplementos e cosméticos, segundo a Grand View Research. A sua entrada em alimentos funcionais é a próxima etapa.
Com relação à quercetina, o seu mercado está a expandir-se rapidamente, projetado para atingir mais de 500 milhões de dólares até 2027, de acordo com a Precision Business Insights, principalmente devido à sua associação com a saúde imunológica e propriedades anti-inflamatórias.
Os desafios: da bioquímica à prateleira
Apesar do enorme potencial, a jornada destes ingredientes do laboratório para um iogurte ou uma bebida funcional é complexa e repleta de obstáculos.
Muitos destes compostos, como a curcumina e o resveratrol, têm baixa biodisponibilidade, o que significa que são mal absorvidos pelo corpo. A indústria de ingredientes está investindo em tecnologias de encapsulamento, como lipossomas e microemulsões, para proteger os ativos e melhorar a sua absorção. Atingir a dosagem eficaz usada em estudos clínicos num formato alimentar, sem afetar o sabor e a textura, é um desafio de formulação significativo.
A fisetina e a quercetina podem conferir um sabor amargo e adstringente, exigindo o uso de mascaradores de sabor. Além disso, a sua estabilidade à luz, calor e oxigénio durante o processamento e a vida útil do produto é uma preocupação crítica.
Há também a questão regulatória, que talvez seja o maior obstáculo. As autoridades reguladoras, como a EFSA (Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos) e a FDA (Food and Drug Administration) dos EUA, não reconhecem o "envelhecimento" como uma doença. Consequentemente, fazer alegações de saúde diretas sobre "anti-envelhecimento" ou "longevidade" num rótulo de alimento é praticamente impossível. As empresas terão de buscar alegações mais seguras e aprovadas, como "contribui para a proteção das células contra as oxidações indesejáveis" ou "apoia o metabolismo energético".




























