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A panificação é talvez uma das artes culinárias mais antigas. A massa arredondada era cozida em cima de uma pedra colocada diretamente sobre o fogo. O resultado era um pão duro, de textura bem diferente da que conhecemos hoje. Com o passar do tempo, começaram a ser usados diferentes tipos de grãos para criar pães com uma variedade de sabores, bem como foram adicionados diferentes ingredientes para fazer pães mais gostosos. Entre os ingredientes enriquecedores do pão estão o açúcar, a gordura e os ovos, entre outros.
O pão nosso de cada dia
(FIB-10) A panificação é talvez uma das artes culinárias mais antigas e sua história permeia a própria história da humanidade. Os primeiros pães foram elaborados no período neolítico, cerca de oito mil anos atrás.
Na Antigüidade, período que data de 8.000 a.C a 600 d.C., o pão já era elaborado nos vales dos rios Tigre e Eufrates, na antiga Mesopotâmia e no vale do rio Hindu. Tinha o formato oval e achatado e era feito com grãos triturados rusticamente, como aveia, cevada, trigo e outras sementes, como gergelim, por exemplo. Os cereais eram misturados com água e deixados sobre pedras, onde levedavam grosseiramente e, então, eram assados, envoltos ou cobertos de brasas. Esses pães de formato estendido ou achatado, denominados em inglês flatbreads, foram os únicos conhecidos pelas civilizações durante milênios, e ainda hoje são produzidos e consumidos largamente em todo o mundo, principalmente nessa mesma região, onde hoje se localiza o Iraque.
Foi no Egito antigo, às margens do rio Nilo, que o pão se transformou definitivamente, através do desenvolvimento de modelos primários de pedras moedoras, bem como das variedades de trigos mais duros. Nessa época, a fermentação da cerveja e a elaboração de pães tornaram-se uma habilidade crescente. Segundo a história, a descoberta de que a massa de pão podia crescer, ou seja, fermentar, aconteceu por mero acaso: um pedaço de massa contendo apenas água e farinha foi esquecido a céu aberto e, naturalmente, foi inoculado pelas bactérias presentes no ambiente, dando início a uma fermentação alcoólica, transformada, após alguns dias, em fermentação ácida, que ofereceu volume à massa. Esse princípio de fermentação foi amplamente explorado até o século XX, quando padeiros começaram a incluir algum fermento comercial para acelerar e potencializar a capacidade de fermentação de sua esponja e/ou pré-fermento.
Em 1859, Louis Pasteur, o pai da microbiologia moderna, descobriu como o fermento funcionava. Alimentando-se de farinha de amido, o fermento produzia dióxido de carbono. Este gás expande o glúten na farinha e leva a massa de pão a expandir e crescer.
Em Roma, o pão levedado se tornou popular por volta de 500 a.C., quando foram desenvolvidos moedores circulares, base de toda moagem até a Revolução Industrial do século XIX.
No século XX, fornos movidos a gás substituíram os fornos de tijolo e lenha, produzindo maior quantidade e qualidade de cocção de pães e massas em geral. As unidades automatizadas para elaboração de pães em grande escala aumentaram sensivelmente a produção de pães.
Ingredientes básicos
(FiB-19) A composição mínima do pão, ou seja, os ingredientes essenciais para obtenção do pão são farinha de trigo, água, sal e fermento biológico.
Farinha de trigo
É o componente estrutural da massa e constitui o ingrediente fundamental para obtenção do pão. A farinha de trigo possui proteínas - a gliadina e a glutenina - com características funcionais únicas, capazes de formar uma rede, o glúten.
O glúten não é um componente que faz parte diretamente da formulação de produtos de panificação. O glúten é formado quando a farinha de trigo, a água e os demais ingredientes do pão são misturados e sofrem a ação de um trabalho mecânico. À medida que a água começa a interagir com as proteínas insolúveis da farinha de trigo (glutenina e gliadina) a rede de glúten começa a ser formada. Sendo assim, o glúten é formado pela interação entre moléculas de gliadina e glutenina que ao se hidratarem formam uma rede. O interesse do glúten nos processos de panificação está basicamente ligado a sua capacidade de dar extensibilidade e consistência à massa, além de reter o gás carbônico proveniente da fermentação, promovendo o aumento de volume desejado. A Figura 1 mostra a formação da rede protéica.
As gliadinas são proteínas de cadeia simples, extremamente pegajosas, responsáveis pela consistência e viscosidade da massa. Apresentam pouca resistência à extensão. As gluteninas, por sua vez, apresentam cadeias ramificadas, sendo responsáveis pela extensibilidade da massa. As quantidades destas duas proteínas no trigo são fatores determinantes para a qualidade da rede formada no processo de panificação. Muitas vezes, farinhas pobres em proteínas precisam ser enriquecidas de glúten para assegurar a qualidade do pão.
FIGURA 1 - FORMAÇÃO DA REDE PROTÉICA ( VEJA NO PDF ABAIXO )
Água
É também um ingrediente imprescindível na formação da massa. Ela hidrata as proteínas da farinha de trigo, tornando possível a formação da rede de glúten. A água atua também como solvente e plastificante e permite que, durante o processo de cozimento do pão, ocorra o fenômeno de gelatinização do amido.
Sal
É indispensável em qualquer formulação de pão. O sal exerce algumas funções, tais como controlar a fermentação, fortificar o glúten das farinhas, já que a gliadina, um de seus componentes, tem maior solubilidade na água com sal, o que proporciona uma maior formação do glúten, ação bactericida, é decisivo na hidratação das massas, atua como ressaltador de sabores, e clareia o miolo do pão.
Fermento biológico
Quando se fala de fermento biológico, refere-se a uma levedura selecionada, denominada Saccharomices cerevisiae. O papel principal do fermento é fazer a conversão de açúcares fermentáveis presentes na massa a gás carbônico e etanol. Além de produzir CO2, que é o gás responsável pelo crescimento do pão, o fermento também exerce influência sobre as propriedades reológicas da massa, tornando-a mais elástica e porosa, que após o cozimento é digestível e nutritiva.
Um fermento de boa qualidade tem na sua composição elementos naturais, como proteínas, carboidratos, enzimas, etc., arranjados em centenas de derivados formados por processos naturais e inerentes à fermentação.
Os principais ingredientes enriquecedores
(Livro – Pão Arte e Ciência – página 131) Os sabores e as qualidades de um pão não podem ser dissociados de sua composição. Dependendo de cada caso particular, um número relativamente significante de ingredientes denominados enriquecedores pode ser adicionado. Entretanto, é importante ressaltar que a adição de novos ingredientes influencia a composição da massa e produz efeitos no sabor e demais características.
O açúcar
Um dos ingredientes enriquecedores do pão é o açúcar, sendo de fundamental importância conhecer o seu modo de ação na massa e como se relaciona com outros ingredientes da receita. Embora outros adoçantes possam ser utilizados na elaboração de produtos de panificação, o açúcar comum ou sacarose é o mais versátil e capaz de desempenhar funções especificas de maneira controlada. Quando utilizado na panificação, além de dar sabor e auxiliar na coloração da casca, o açúcar melhora também a textura das migalhas, ao atuar como retentor na saída da umidade da massa. Porém, seu uso em excesso retarda a ação do fermento, devendo ser balanceado com os demais ingredientes.
Por definição, o açúcar é um carboidrato que ocorre naturalmente em toda fruta e vegetal. É o produto principal da fotossíntese, processo pelo qual as plantas transformam a energia solar em alimento. É encontrado também nos tecidos de muitos animais (ribose).
O termo açúcar é aplicado vagamente para qualquer composto químico do grupo de carboidratos, rapidamente solúvel em água, que cristaliza e adiciona mais ou menos doçura e sabor. Em geral, todos os monossacarídeos, dissacarídeos e polissacarídeos são nomeados açúcar.
Os açúcares são conhecidos ainda pelo seu número de moléculas de carbono: pentoses (cinco carbonos), trioses (três carbonos), tetroses (quatro carbonos), heptoses (sete carbonos), octoses (oito carbono) e nonoses (nove carbonos). Todas são encontradas na natureza, porém a mais presente são as hexoses, caracterizadas pela presença de seis átomos de carbono na molécula e pela forma empírica C6H12O6. O mais importante dos açúcares hexose são glicose-galactose, os quais são aldeído-frutoses, que são ketones, similares, mas não menos reativos do que o aldeído. Os açúcares dissacarídeos maltose, lactose e sacarose possuem a mesma fórmula empírica, ou seja, C12H22O11. A estrutura química da sacarose é apresentada na Figura 2.
FIGURA 2 - ESTRUTURA DA SACAROSE ( VEJA NO PDF ABAIXO )
Todos os tipos de açúcar encontrados no mercado foram processados de alguma maneira. O açúcar branco contém açúcar purificado, apenas sacarose pura. Não contém conservantes ou aditivos de qualquer espécie. É utilizado largamente na culinária em geral. O que varia são os tamanhos dos grânulos ou cristais aos quais a sacarose é reduzida. Quanto menores os cristais, mais rápida a dissolução do açúcar na mistura.
O açúcar granulado é o açúcar de mesa, utilizado na maioria das receitas.
O açúcar de confeiteiro é o açúcar mais comum, processado em pó fino e de textura macia, contendo aproximadamente 3% de amido para prevenir o aglutinamento. É utilizado em coberturas, confeitos e creme chantilly.
No açúcar cristal os tamanhos dos cristais do açúcar são maiores do que o do açúcar regular. É usualmente processado do licor de açúcar mais puro. O método de processamento torna-o mais resistente e alterações de coloração ou inversão (quebra natural de frutose em glicose) sob altas temperaturas. Essas características são importantes quando da elaboração de fondants, licores e confeitos.
O açúcar marrom ou mascavo difere do açúcar branco comum por ser preparado com a adição de melado, que acaba controlando seu odor/sabor naturais e sua coloração. Na realidade, trata-se do açúcar branco combinado com melado. Quanto menos melado, mais suave o sabor e mais clara a coloração, sendo encontrado no mercado como açúcar mascavo claro. Se a coloração é mais escura, houve mais adição de melado, e mais acentuado é o sabor. Ao ser utilizado em receitas com medida, por exemplo ½ xícara, deve ser comprimido firmemente no medidor, pois a adição de um elemento relativamente úmido proporciona mais volume. Ambos os tipos de açúcar mascavo, escuro e claro, são utilizados na elaboração de condimentos e na panificação e confeitaria geral.
O açúcar invertido, que resulta da quebra ou inversão da sacarose, tendo a mistura de partes iguais de glicose e frutose, é comercialmente disponível apenas em estado líquido. A indústria de refrigerantes ou bebidas carbonatadas utiliza-se de um tipo de açúcar invertido específico, que pode ser utilizado apenas em produtos líquidos, sendo composto de uma parte de açúcar invertido combinada com açúcar granulado dissolvido. Outro tipo, denominado açúcar invertido total, é produzido para a indústria de alimentos processados e é praticamente todo invertido. Esse tipo é maciçamente utilizado para retardar a cristalização do açúcar e para auxiliar na retenção de umidade.
A glicose tem na sua forma mais comum a dextroglicose, também chamada glicose de milho e/ou açúcar de uva. Essa forma de glicose contém muitos recursos, incluindo o suco de uva, alguns vegetais e o próprio mel, apresentando 50% da capacidade de adoçar em relação ao açúcar comum. É encontrada em coloração clara e escura, sendo que a glicose de milho escura usualmente adiciona sabor e coloração artificial. Por ser rara a cristalização, é utilizada na elaboração de confeitos, refrigerantes e outros alimentos processados.
O xarope de amido, desenvolvido pelo tratamento do milho com um ácido, calor e/ou enzima, não é tão doce quanto à sacarose, mas é geralmente utilizado com o açúcar comum ou em lugar dele, com efeitos benéficos principalmente na elaboração de balas e confeitos, devido as suas habilidade anticristalizadoras. É solúvel em água e derrete a temperatura de 145ºC, ou ainda, 27ºC abaixo do ponto de derretimento da sacarose. Não cristaliza e auxilia a inibição da cristalização da sacarose.
O mel é a mistura de açúcares formados do néctar por uma enzima, a invertase, presente no corpo das abelhas. Os açúcares contidos no mel são também encontrados na sacarose, frutose e glicose. O mel varia de composição e sabor, dependendo da fonte do néctar. A análise básica do mel apresenta cerca de 38% de frutose, 31% de glicose, 1% de sacarose, 9% de outros açúcares, 17% de água e 0,17% de cinzas. Muito pouca diferença nutricional existe entre o mel e o açúcar comum, porém, o mel, por ser mais concentrado do que o açúcar, contém mais calorias e é mais doce do que a sacarose. Possui aroma e sabor distintos. Os produtos elaborados com mel são mais úmidos porque a frutose absorve umidade do meio ambiente; o excesso de mel acarreta coloração de casca/crosta.
O melado não é tão doce quanto à sacarose. Possui odor e aroma característicos e apresenta bastante variação de um produto para outro. Por ser mais ácido do que o açúcar, as receitas elaboradas com melado usualmente contêm bicarbonato de sódio, assim como as elaboradas com mel.
Os adoçantes artificiais são essencialmente isentos de caloria energética, amplamente utilizados em dietas hipocalóricas, mas com uso restrito na culinária. Se comparados à sacarose, adoçam, mas na panificação produzem deficiências na caramelização de crostas, no amaciamento da massa e nas propriedades de retenção de umidade. O aspartame e a sacarina são os mais conhecidos no mercado. A sacarina suporta calor de maneira estável (permite cocção) e seu poder de adoçar é de 200 a 300 vezes maior do que o da sacarose ou o açúcar comum.
Um dos adoçantes artificiais é o acessulfame-k, que também se mantém estável à cocção. Conserva algumas das propriedades do açúcar na massa e não apresenta gosto residual. A estrutura química do acessulfame-k é apresentada na Figura 3.
FIGURA 3 - ESTRUTURA DO ACESSULFAME-K ( VEJA NO PDF ABAIXO )
O aspartame adoça cerca de 200 vezes mais do que a sacarose ou o açúcar comum. É sintetizado de aminoácidos, ácido aspártico e fenilalanina, que contém em torno de 4 calorias/grama. Não suporta calor (não pode ser assado ou adicionado à caldas/caramelos), e por isso não é utilizado em produtos de panificação.
A Tabela 1 apresenta as principais utilizações e características do acessulfame-k, do aspartame e da sacarina em panificação.
TABELA 1 - USOS E CALORIAS DO ACESSULFAME-K E DO ASPARTAME E DA SACARINA ( VEJA NO PDF ABAIXO )
A estévia não é um adoçante artificial, como os expostos anteriormente, sendo um adoçante não-calórico e, embora seja muito mais doce do que o açúcar, tampouco é considerada um açúcar, já que não contém as propriedades físico-químicas do açúcar. A estévia substitui o açúcar em praticamente todas as receitas. Entretanto, o ponto de discussão é a proporção, ou seja, não se substitui estévia por açúcar na mesma proporção. A estévia pode ser, comedidamente, empregada em todas as preparações culinárias que peçam o uso da sacarose, mas sua aplicação deve ser extremamente cuidadosa! Especificamente em massas fermentadas, a estévia não é recomendada. Embora mais doce do que o açúcar, a estévia não contém as mesmas propriedades. Primeiramente, não é fermentável. Além disso, por não ser açúcar, não apresenta a mesma capacidade de fermentação do açúcar, pois não pode alimentar as bactérias do processo. Por isso, produtos fermentados preparados com estévia não sofrem a reação de Maillard, ou seja, não caramelizam, apresentado-se opacos e com mudanças essenciais de textura, sabor e aparência no produto final. Assim, a estévia pode ser utilizada na fabricação de massas fermentadas apenas como adoçante, uma vez que, a altas temperaturas, não perde seu poder adocicante, como a maioria dos adoçantes artificiais.
Os açúcares envolvidos no processo de fermentação se originam de açúcares pré-existentes, como sacarose, glicose e levulose, que estão presentes nas farinhas, normalmente entre 1% e 2%; e açúcares gerados pela quebra da amilase e pela degradação de frações do amido por amilases contidas na massa; isso produz maltose no curso da fermentação.
Entre as funções gerais mais importantes do açúcar estão a interação com as moléculas de proteína ou amido durante o processo de cocção; atuação como amaciador pela absorção de água e pela inibição do desenvolvimento do glúten na farinha; retardo da gelatinização do amido, incorporação de ar à gordura durante o processo de método cremoso; caramelização quando exposto a altas temperaturas, oferecendo coloração e aroma agradáveis na cocção; aceleração da fermentação, ao prover alimento ao fermento; retardo da coagulação da proteína dos ovos em pudins e cremes; retardo do escurecimento da superfície de frutas; acentuação da maciez e do sabor de sorvetes, sherbets e sorbets; e controle da recristalização por meio do desenvolvimento do açúcar invertido.
Em massas fermentadas o açúcar desempenha funções específicas. No desenvolvimento de glúten, por exemplo, durante a mistura da massa, o açúcar age como amaciador ao absorver a água e desintensificar o desenvolvimento do glúten. As proteínas da farinha são hidratadas, formando a cadeia de glúten, composta por milhares de pequenas bolsinhas que aprisionam os gases produzidos durante a fermentação. Essas cadeias de glúten são elásticas e permitem à massa crescer sob a expansão de gases. Contudo, se muito glúten for desenvolvido, a massa se torna rígida e dura.
O açúcar compete com essas proteínas formadoras de glúten por água, prevenindo assim a super-hidratação das proteínas durante a fase da mistura. Em consequência, é desenvolvido menos glúten, e a massa fica menos rígida. Utilizado na proporção correta, o açúcar otimiza a elasticidade da massa, deixando-a mais suave, com produto final de textura macia e bom volume.
Outro exemplo é na fermentação, onde o açúcar aumenta a eficácia do fermento. O açúcar é quebrado pelas células do fermento, que o transforma em alimento, e o gás carbônico é expelido mais rapidamente. O processo de fermentação é agilizado e mais consistente.
O açúcar também age na coagulação da proteína do ovo, adiando sua coagulação durante a cocção. Com a elevação da temperatura da mistura durante a cocção, as proteínas do ovo coagulam ou formam elos entre si. As moléculas de açúcar elevam a temperatura desses elos. Quando essas proteínas coagulam, o bolo está assado por igual.
Também durante a cocção, com a absorção de líquidos, o açúcar amacia, prolongando a gelatinização.
Em bolos, o calor do forno faz com que o amido da farinha absorva líquido e endureça. Quanto mais líquido for absorvido pelo amido, mais firme se fará, até atingir o estado sólido. O açúcar atua para prolongar a gelatinização, competindo com o amido pelo líquido presente na massa. Absorvendo parte do líquido presente, o açúcar mantém a viscosidade da mistura. Como resultado, a temperatura em que o bolo se firma é esticada ao máximo para desfrutar da ação expansora oferecida pelos gases expelidos pela ação do fermento químico.
As características do uso do açúcar podem ser observadas em produtos específicos. Pães fermentados biologicamente utilizam açúcar para acelerar a expansão da massa, na produção indireta de gás carbodióxido. Durante a fase de mistura, o açúcar absorve grande quantidade de água, atrasando a formação de glúten, o que torna a massa bastante elástica, ideal para aprisionar os gases e formar uma boa estrutura. Pela reação de Maillard, o açúcar contribui para a coloração da crosta e o aroma característico dos pães. Utilizado para acelerar a fermentação, produz gás carbodióxido para a expansão da massa.
Os pães rápidos são elaborados com o uso de agentes expansores químicos, mais rápidos do que o biológico. Por terem conteúdo pequeno de gordura e açúcar, o processo de mistura nos pães rápidos é de extrema importância para sua leveza e textura. O glúten não pode ser muito desenvolvido, pois a ausência de açúcar retira sua habilidade de amaciamento.
As gorduras
Os triglicerídeos, conhecidos como banha, manteiga, margarina, gordura e óleo, vêm sendo usados por séculos na culinária para auxiliar na expansão, dar sensação de umidade significativa na boca e aumentar a vida útil do produto a ser estocado.
Quimicamente, todas as gorduras e óleos têm a mesma composição - carbono, hidrogênio e oxigênio. A diferença entre elas é que em cada estrutura química haverá uma combinação diferente de número de ácidos graxos com glicerina, o que altera o estado físico em que se encontram. A gordura que está em forma líquida quando em temperatura ambiente é denominada “óleo”, e a que se encontra em estado sólido, “gordura”.
Gorduras e óleos são misturas de triglicerídeos. São formados pela combinação entre três cadeias de moléculas de átomos de carbono e duas de átomos de hidrogênio, atreladas principalmente por carbonos. Quanto mais longas as cadeias, mais alta a temperatura de derretimento da gordura. Isso significa que as cadeias curtas oferecem óleos (líquidos) e as cadeias mais longas oferecem gorduras (sólidas).
A gordura na forma sólida, ou seja, margarina, manteiga ou gordura hidrogenada, ou na forma líquida, como em óleos, basicamente previne o super desenvolvimento ou o endurecimento do glúten, assegurando suavidade, retenção de umidade e, quanto ao paladar, características de dissolver-se na boca, tão adequadas em tantos produtos de panificação e confeitaria.
As gorduras podem ser saturadas, monossaturadas ou poliinsaturadas.
As gorduras saturadas, comumente de origem animal, são encontradas em carnes vermelhas, óleo de coco, óleo de palmeira, chocolate, banha de porco, leite e produtos à base de leite, como manteiga, creme de leite, entre outros. As gorduras saturadas são boas para uso em panificação e confeitaria por sua plasticidade e pela capacidade em auxiliar no crescimento das massas, mas prejudiciais à saúde, estando associadas à elevação do colesterol.
As gorduras monossaturadas são encontradas em óleo de oliva, óleo de canola, nozes de variados tipos, manteiga de amendoim, óleo de amendoim, entre outros. São melhores para a saúde, mas não são utilizadas com êxito na indústria de panificação e confeitaria.
As gorduras poliinsaturadas, encontradas em óleos vegetais, como milho, soja, gergelim, algodão e girassol, são ingredientes importantes na panificação, responsáveis por melhorar a textura, gosto e sensação na boca, além de contribuírem nutricionalmente na dieta humana.
Em panificação, as gorduras diminuem as cadeias de glúten, dando maciez e umidade à massa, além de prolongar a vida útil do pão. Contribuem para dar sabor, cor, textura, além de auxiliar como aerador de produtos elaborados com o método cremoso, permitindo a incorporação de ar na massa.
Auxilia no manuseio da massa, deixando-a menos pegajosa. A gordura encurta as cadeias de glúten e, assim agindo, amacia o produto. Encapa o glúten e outros ingredientes e os lubrifica para que não fiquem pesadamente coesos e sem espaço para expansão.
Possibilita na melhor retenção do gás carbônico liberado na fermentação, devido à lubrificação das cadeias de glúten, impedindo seu super desenvolvimento (e endurecimento). Ao assar, forma uma película protetora da umidade. É o único ingrediente que estará integralmente presente no produto final, sem nenhuma perda.
A gordura acentua o sabor de alguns ingredientes e contribui com seu próprio sabor, como é o caso da manteiga. Em pães rápidos, como muffins, por exemplo, reduzir o conteúdo de gordura pode comprometer seriamente a maciez do produto, pois permite que o glúten se desenvolva mais livremente. Muitas receitas prevêem outro agente amaciador, como o açúcar, por exemplo, ou ovos, para aumentar a maciez, e assim substituem a gordura. Adicionar um mínimo de gordura, mesmo na massa do pão francês, apenas para garantir o desenvolvimento de um glúten elástico, dando ao pão maior volume, não oferece problema.
A escolha do tipo de gordura a ser incorporada à massa deve sempre considerar as características que cada uma delas oferece, seja de sabor, coloração, textura, formação de crosta, entre outros aspectos.
Os ovos
Apesar de não ser considerado ingrediente básico, o ovo é largamente utilizado em produtos de panificação e confeitaria. A gema, que corresponde a 33% do peso liquido do ovo, possui cerca de 50% de seu conteúdo de sólidos, dois quais mais da metade é gordura emulsificada, sendo utilizada na panificação pelo efeito da coloração, sabor e textura.
Na panificação, os ovos são utilizados em várias funções. Dão sabor, cor, contribuem para a formação estrutural da massa, incorporam ar quando batidos, providenciam líquido, gordura e proteína e emulsificam gordura e ingredientes líquidos.
Reduzir a quantidade de gemas resulta em um produto menos macio, pois a gema contém aproximadamente 35% da gordura do ovo. Omitir ou reduzir a quantidade de claras pode resultar em significativa perda de volume. Os bolos e pães rápidos elaborados sem o auxilio emulsificante das gemas podem não ter a textura e o sabor distribuídos uniformemente.
As massas com grande quantidade de ovos (massas gordas), normalmente, também requerem grande quantidade de açúcar, como a massa doce. Geralmente, são assados em temperaturas baixas porque tendem a adquirir coloração mais rapidamente do que as massas mais magras.
Já na confeitaria, o ovo é o principal ingrediente, sendo utilizado em praticamente todas as preparações, como bolos, sobremesas e cremes, sorvetes e tortas. Podem aglutinar ingredientes e serem utilizados como expansores, em patê au choux (massa de bomba), suflês e bolos genoise. São espessantes naturais em cremes e molhos. Emulsificam maioneses e molhos para saladas. São utilizados para proporcionar brilho e acabamento a pães, tortas e massa folhada, por exemplo. Clarificam sopas. Em confeitos e coberturas, retardam a cristalização, quando da utilização das claras.
A temperatura do ovo afeta diretamente vários processos, como por exemplo, o de aeração e o de cremeamento. Ovos frios, quando utilizados em misturas cremosas, esfriam e endurecem levemente a gordura que está sendo transformada em creme, tornando necessário um período de mistura mais longo do que o necessário ou, ainda, em casos mais extremos, mudando significativamente a textura final da produção.
Na massa, os ovos incrementam o processo de cremosidade porque aumentam o número de células de ar com gordura, permitindo que o processo de expansão tenha continuidade e sustentação. No forno, as células de ar continuam se expandindo e a evaporação parcial da umidade em forma de vapor potencializa o crescimento. Quando o ovo é batido, a espuma formada dará sustentação ao produto final.
As gemas proporcionam uma desejável coloração amarela, que oferece aparência mais rica e apetitosa em bolos, cremes e outras preparações. As gemas contêm emulsificantes naturais, que auxiliam na produção de massas suaves. Além disso, a gordura contida nas gemas atua como amaciador ou relaxador da estrutura que está sendo formada.
Devido à presença de proteínas e de outros sólidos, os ovos, além de serem fonte de riqueza alimentar, auxiliam na maciez da mistura, tornando-a mais fácil de ser manipulada.
Outros ingredientes enriquecedores
No decorrer dos séculos toda a produção da arte culinária, incluindo-se os produtos de panificação e confeitaria, vêm sendo flavorizada ou condimentada por uma infinidade de temperos e flavorizantes que proporcionam aroma, sabor e odor exótico aos produtos finais. A seguir, apresentamos alguns flavorizantes e especiarias utilizados na panificação.
O açafrão (Crocus sativus) é uma das especiarias utilizadas na fabricação de uma variedade de pães. Originário da Ásia menor, é cultivado há milhares de anos e utilizado em medicamentos, perfumes e alimentos. O açafrão adiciona sabor pungente e aromático aos alimentos, além da coloração exótica. É utilizado como ingrediente indispensável em paella, no bouillabaisse, e no licor chartreuse e, em panificação, no pão challah, por exemplo.
Já o anis ou erva-doce (Pimpinella anisum) é uma planta da família das Apiaceae, anteriormente chamadas Umbelliferae. A sua fruta em forma de semente é usada em confeitaria e em licor (como anisete, zammù, uzo). A fruta consiste em dois pistilos unidos e tem um sabor aromático forte e um odor poderoso. A semente de anis também é usada em alguns pratos com frutos do mar, contra mau hálito e como auxiliar digestivo. Todas as partes que ficam acima do solo de uma planta jovem de anis também são comidas como vegetal. Os caules se parecem com os do aipo na textura e são mais suaves no sabor do que os frutos.
A baunilha é a essência adocicada e aromática obtida dos frutos da orquídea Vanilla planifólia. Tanto o nome do gênero Vanilla como "baunilha" derivam do espanhol vainilla, que significa "pequena vagem", em alusão à forma do fruto. A baunilha também é o nome popular das orquídeas deste gênero. Bastante comum nas Américas, onde é nativa, a baunilha é a única espécie de orquídea trepadeira. Atualmente, existe um aromatizante obtido artificialmente que simula o aroma de baunilha. Por ter uma produção rápida e a baixo custo (enquanto a produção de baunilha natural depende da floração e frutificação da planta), tem substituído o aroma natural na indústria de alimentos. Entretanto, o aroma natural ainda é artesanalmente usado em chocolates, doces, sorvetes e bebidas.
A canela, derivada da caneleira (Cinnamomum zeylanicum), é muito utilizada na culinária como condimento e aromatizante e na preparação de determinados tipos de chocolate e licores. O sabor e aroma intensos vêm do aldeído cinâmico ou cinamaldeído. A caneleira é uma pequena árvore com aproximadamente 10 a 15 metros de altura, pertencendo à família Lauraceae. É nativa do Sri Lanka, no Sul da Ásia. As folhas possuem um formato oval-longo com 7 a 18 cm de comprimento. As flores, que florescem em pequenos maços, são esverdeadas e possuem um odor distinto. A fruta, arroxeada, com aproximadamente um centímetro, produz uma única semente. A canela é a especiaria obtida da parte interna da casca do tronco.
O cardamomo constitui uma especiaria vastamente usada na Coréia, Vietnam e Tailândia. O nome cardamomo é usado para designar diversas espécies em três gêneros da família do gengibre (as zingiberáceas): Elettaria, Amomum e Aframomum. O cardamomo foi usado pela primeira vez aproximadamente no ano 700 d.C., na Índia meridional, e foi importado para a Europa, pela primeira vez, em 1200. São plantas nativas das florestas úmidas do Sul da Índia, do Sri Lanka, Malásia e Sumatra. Atualmente, é cultivado no Nepal, Tailândia e América Central.
O craveiro (Syzygium aromaticum), de onde se origina o cravo, é uma árvore nativa das ilhas Molucas, na Indonésia. Atualmente, é cultivado em outras regiões do mundo, como as ilhas de Madagascar e de Granada. O botão de sua flor, seco, é utilizado como especiaria desde a Antiguidade, empregado na culinária e na fabricação de medicamentos. A flor do craveiro é usada como tempero desde a Antiguidade: era uma das mercadorias, entre as especiarias da China, que motivaram inúmeras viagens de navegadores europeus para o continente asiático. Na China, os cravos eram usados não só como condimento, mas também como anti-séptico bucal.
O funcho, também conhecido por anis-doce, erva-doce, maratro ou finóquio, ou fiuncho, é o nome vernáculo dado à espécie herbácea Foeniculum vulgare Mill. (sinônimo taxonômico de Anethum foeniculum L. e de Foeniculum officinale L.), uma umbelífera fortemente aromática comestível utilizada em culinária, perfumaria e como aromatizante na fabricação de bebidas espirituosas e planta medicinal. É frequentemente utilizada em pequenas quantidades na cozinha mediterrânica como planta aromatizante, particularmente os das variedades menos ricas em óleos essenciais, sendo consumidas em frescas como parte de saladas. Podem também ser incorporadas em sopas, em particular sopas destinadas a serem consumidas frias. Um dos pratos típicos dos Açores é uma sopa de feijão e inhame com folhas e caules tenros de funcho. É frequente o seu uso como aromatizante em molhos, conservas de vegetais, curtumes e outros preparados semelhantes. Usada em baixas concentrações oferece aroma e sabor discretos, semelhante ao mentolado, porém bastante mais suave e doce. As sementes secas são utilizadas em chás e como aromatizante em licores e bebidas alcoólicas destiladas.
O gengibre (Zingiber officinale) é uma planta herbácea da família das Zingiberaceae, originária da ilha de Java, da Índia e da China, de onde se difundiu pelas regiões tropicais do mundo. O gengibre possui sabor picante e pode ser usado tanto em pratos salgados quanto nos doces e em diversas formas: fresco, seco, em conserva ou cristalizado. O que não é recomendado é substituir um pelo outro nas receitas, pois seus sabores são muito distintos, o gengibre seco é mais aromático e tem sabor mais suave. O gengibre fresco é amplamente utilizado na China, no Japão, na Indonésia, na Índia e na Tailândia. No Japão, costuma-se usar o suco (com o gengibre espremido) para temperar frango; as conservas (beni shouga) feitas com os rizomas jovens são consumidas puras ou com sushi. Já o gengibre cristalizado é um dos confeitos mais consumidos no Sudeste Asiático. O seu caule subterrâneo é utilizado como especiaria desde a Antiguidade, na culinária e na preparação de medicamentos.
O gergelim (Sesamum indicum) é uma planta anual herbácea, gamopétala, originária do Oriente, pertencente à família das Pedaliaceae. É cultivada na Ásia tropical devido as suas sementes, que fornecem até 50% de óleo. As sementes de gergelim são ricas em manganês, cobre e cálcio (90mg de cálcio por colher de sopa para sementes integrais, não descascadas, e 10mg para sementes descascadas), além de conter vitamina B1 e vitamina E. O óleo de gergelim é um dos mais importantes do gênero e um dos mais antigos. O uso de sementes secas do gergelim também é bastante popular. Na Ásia, são normalmente utilizadas tostadas; na Jordânia, a mistura de especiarias, denominada zahtar, é muito difundida. No Oeste da Ásia, uma pasta chamada tahini, elaborada da moagem de sementes secas, é muito utilizada como espessante e flavorizante de molhos. Homus é uma pasta preparada na culinária libanesa e israelita; na culinária mexicana um molho denominado mole utiliza a semente de gergelim como base.
A noz-moscada é uma das especiarias obtidas do fruto da moscadeira (Myristica fragans), uma planta da família das Myristicaceae, de porte alto, atingindo cerca de 10 a 15 metros de altura, com várias ramas dispostas ao longo do tronco principal. A polpa da fruta, da qual se extrai a noz-moscada, é muito azeda e de paladar amadeirado. É largamente comercializada, principalmente na Europa, como condimento na indústria frigorífica.
A abóbora (Cucurbita pepo) é nativa da América Central, onde é cultivada há milênios. Após os espanhóis descobrirem a América, a abóbora foi levada à Europa e Ásia, onde foi adotada devido a seu custo baixo e significativa qualidade nutricional. O óleo é extraído da variedade da abóbora sem sementes, produzida apenas na Áustria e adjacências. O sabor do óleo é tão forte que apenas a culinária da região o utiliza. Já a semente de abóbora tostada apresenta aroma intenso, levemente picante e nucicado (nozes).