A fibra alimentar ou dietética é um termo genérico que engloba uma ampla variedade de substâncias que não são digeridas pela parte superior do trato digestivo humano. Do ponto de vista físico-químico, é um grupo muito heterogêneo que, com exceção da lignina, são polissacarídeos, ou seja, polímeros complexos de grande tamanho.
As fibras não são assimiladas pelo organismo humano, que carece de enzimas específicas para executar essa função. No entanto, contribuem para facilitar a passagem do alimento através do sistema intestinal, previnem a constipação, regulam os níveis de colesterol no sangue e normalizam a absorção de açúcares a partir de alimentos. Além disso, ajudam a reduzir a glicemia pós-prandial ou os níveis de insulina no sangue. Da mesma forma, esses compostos podem ser assimilados e absorvidos pela flora intestinal, essenciais para o bom funcionamento do trato intestinal e para manter os níveis imunológicos do organismo.
Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), a fibra alimentar e algumas de suas frações específicas, como a betaglucana (aveia), goma guar parcialmente hidrolisada (só para espécie vegetal), dextrina resistente, frutooligossacarídeos, inulina, polidextrose, lactulose, psyllium e quitosana, podem utilizar a alegação de propriedade funcional desde que a porção do produto pronto para consumo forneça no mínimo 3g de fibras (ou de fração específica) se o alimento for sólido, ou 1,5g de fibras (ou de fração específica) se líquido. Outras observações devem ser adicionadas no rótulo do alimento, dependendo do tipo de fibra alimentar, por exemplo: quantidade de fibra alimentar; quantidade da fração específica de fibra alimentar (colocar logo abaixo da declaração nutricional de fibra alimentar); quantidade diária máxima para consumo, entre outros. Todas essas alegações sempre devem ser complementadas com a frase relativa ao consumo associado a uma alimentação equilibrada e hábitos de vida saudáveis.
A alegação permitida para fibra alimentar é: “As fibras alimentares auxiliam o funcionamento do intestino. Seu consumo deve estar associado a uma alimentação equilibrada e hábitos de vida saudáveis”.
Outros exemplos de alegações permitidas relativas a algumas frações de fibra alimentar são: “Os frutooligossacarídeos (ou a inulina) contribuem para o equilíbrio da flora intestinal”; “A betaglucana (fibra alimentar) auxilia na redução da absorção de colesterol” (somente para aveia); “O psyllium (fibra alimentar) auxilia na redução da absorção de gordura”; e “A quitosana auxilia na redução da absorção de gordura e colesterol”.
No caso desses produtos na forma de cápsulas, tabletes, comprimidos e similares, os requisitos acima devem ser atendidos na recomendação diária do produto pronto para o consumo, conforme indicação do fabricante. Deve constar nos rótulos dos produtos a seguinte informação, em destaque: “O consumo deste produto deve ser acompanhado da ingestão de líquidos”.
A ANVISA permite que “novos ingredientes”, como amido resistente com alto teor de amilose, frutooligossacarídeos, goma acácia (goma arábica), goma guar parcialmente hidrolisada, inulina, entre outros, quando usados em produtos dispensados da obrigatoriedade de registro, esses produtos continuarão dispensados da obrigatoriedade. Entretanto, esses ingredientes devem ser declarados na tabela de informação nutricional como fibra alimentar, não sendo permitido especificá-los abaixo da quantidade de fibra alimentar.
A fibra alimentar ou dietética contém todas as características necessárias para ser considerada como um ingrediente importante na formulação de alimentos, devido aos seus efeitos benéficos à saúde.
Para ser aceitável, uma fibra dietética deve funcionar de forma satisfatória como ingrediente adicionado a um produto alimentício. Do ponto de vista funcional, a fibra pode desempenhar inúmeras funções: ser usada como ferramenta para melhorar a textura; como agente de volume; em aplicações de redução de açúcar; para gerenciar a umidade na reposição de gordura; para adicionar cor; e como antioxidante natural.
As fibras dietéticas podem fornecer uma infinidade de propriedades quando incorporadas em sistemas alimentícios, contribuindo para a modificação e melhoria da textura, das características sensoriais e shelf life dos alimentos, devido a sua capacidade de retenção de água, de formação de gel, antiaderência, antiaglomeração, texturização e efeitos espessantes.
A literatura contém diversos relatos sobre a adição de fibras dietéticas em produtos alimentícios, incluindo seu uso nos setores de panificação, bebidas, confeitaria, laticínios, carnes, massas e sopas.
Tradicionalmente, o enriquecimento de produtos de panificação consistia na adição de cereais não refinados. No entanto, atualmente, utilizam-se outras fontes de fibra dietética, que apresentam melhor qualidade nutricional, maior quantidade de fibra solúvel, menor conteúdo calórico, maior capacidade antioxidante e maior grau de fermentabilidade e retenção de água.
Comumente, as fibras alimentares são incorporadas em produtos de panificação para prolongar a frescura, graças a sua capacidade de retenção de água, reduzindo, assim, as perdas econômicas. As fibras podem modificar o volume e a firmeza do pão, a sua elasticidade e a suavidade das migalhas. As fibras dietéticas de diferentes fontes, como celulose, farelo de trigo e de aveia, têm sido usadas para substituir a farinha de trigo no preparo de produtos de panificação.
A adição de fibra dietética em produtos de panificação também melhora a sua qualidade nutricional, uma vez que possibilita diminuir o teor de gordura, utilizando a fibra dietética como substituto de gordura, sem perda de qualidade. Componentes isolados de fibras, como o amido resistente e a betaglucana, também são usados para aumentar o teor de fibras em bolos, cereais matinais, etc.
As fibras dietéticas também podem ser usadas para melhorar a textura de produtos cárneos, como salsichas e salame, sendo, ao mesmo tempo, adequadas para o preparo de produtos com baixo teor de gordura, como os hambúrgueres dietéticos. Além disso, uma vez que possuem a capacidade de aumentar a retenção de água, sua inclusão na matriz de carnes contribui para manter a sua suculência. O farelo ou fibra de aveia é um substituto de gordura adequado em carnes bovina e suína, devido a sua capacidade de reter água e emular a definição de partículas na carne moída, tanto em termos de cor como de textura. Preparações de fibra dietética e de proteína de soja são amplamente utilizadas em muitos ramos da indústria alimentícia, incluindo o setor da carne, devido as suas propriedades funcionais.
Já no setor de bebidas, a adição de fibra dietética aumenta a viscosidade e a estabilidade, sendo a fibra solúvel a mais utilizada por ser mais dispersível em água do que a fibra insolúvel. Alguns exemplos dessas fibras solúveis são as frações de grãos e multifrutos, pectinas, betaglucanas, celulose, fibras de beterraba, polidextrose, etc. A fibra de aveia, por exemplo, pode ser incorporada em produtos lácteos, bebidas instantâneas, suco de frutas e vegetais, chá gelado, bebidas esportivas, cappuccino e vinho. Outras bebidas que podem se beneficiar da adição de fibras são as bebidas de dieta líquida, tanto as destinadas para pessoas com necessidades dietéticas especiais, quanto para perda de peso ou substitutas de refeições.
A utilização de fibras em produtos lácteos também é generalizada: a inulina, por exemplo, fornece inúmeros melhoramentos aos produtos lácteos. Melhoram o corpo e o mouthfeel em análogos de queijo e sorvetes, bem como reduzem a sinérese em iogurtes e outros produtos lácteos fermentados.
A adição de componentes da fibra, tais como alginatos, goma guar e géis de celulose, em sorvetes e iogurtes não apenas substitui a gordura, mas também fornece viscosidade, melhora a emulsão, a espuma, o congelamento/descongelamento, controla as propriedades de fusão, reduz a sinérese, promove a formação de cristais de gelo menores e facilita a extrusão.
Para a elaboração de geleias e compotas, as fibras mais comumente adicionadas são aquelas que consistem em pectinas com diferentes graus de esterificação, mantendo a estabilidade do produto final. No caso de chocolates e derivados de baixa caloria, compostos de fibras, como a inulina e a oligofrutose, são utilizados como substitutos de açúcar.
De seu uso tradicional para enriquecer produtos de panificação à sua aplicação em produtos cárneos, bolos e doces, sorvetes, como substitutos do açúcar, pratos prontos e massas, croquetes congelados, produtos à base de peixe ou produtos de confeitaria, entre outros, a indústria alimentícia tem cada vez mais utilizado esses compostos para oferecer novas aplicações para atender à crescente demanda por fibras.