O colágeno é a proteína estrutural fibrosa mais abundante em vertebrados e invertebrados e constitui aproximadamente 30% do total de proteínas de um animal. Seu nome deriva das palavras gregas Kolla (cola) e Genno (produção) e denomina uma família de 27 proteínas isoformas encontradas nos tecidos conjuntivos do organismo. Contém cadeias peptídicas dos aminoácidos glicina, prolina, lisina, hidroxilisina, hidroxiprolina e alanina, organizadas de forma paralela a um eixo, formando as fibras de colágeno, que proporcionam resistência e elasticidade à estrutura presente. As proteínas colagenosas formam agregados supramoleculares (fibrilas, filamentos ou redes), sozinhas ou em conjunto com outras matrizes extracelulares. Sua principal função é contribuir com a integridade estrutural da matriz extracelular ou ajudar a fixar células na matriz. Apresenta estrutura molecular relativamente simples e é insolúvel em água, em virtude da grande concentração de aminoácidos hidrofóbicos, quer no interior da proteína, quer na superfície. Possui propriedades mecânicas singulares e é quimicamente inerte.
O colágeno desempenha várias funções e suas moléculas se dispõem de diferentes maneiras, de acordo com a função a ser desempenhada, variando em diâmetro, composição de aminoácidos, comprimento, estrutura molecular, concentração e localização nos tecidos. Dos diversos colágenos já identificados, os mais conhecidos são os numerados de I a IV, que diferem entre si pela fórmula química, pelo modo de associação entre suas moléculas e pelas funções que desempenham.
O colágeno I foi o primeiro a ser identificado e é o mais abundante; está presente na pele, nos ossos, nos dentes e nos tendões e apresenta-se sob a forma de fibras grossas, sendo, por esse motivo, o mais resistente a tensões.
O tipo II é encontrado nas cartilagens e produzido pelas células cartilaginosas. Como não forma fibras, só é visível com microscópio eletrônico. Associa-se a outras células da matriz extracelular, ligando-se fortemente à água. Funciona como uma esponja, cedendo água quando pressionado e voltando a forma primitiva quando a pressão cessa.
O tipo III é constituído por fibras nas artérias, no músculo dos intestinos e do útero e em órgãos como o fígado, o baço e os rins. É produzido pelas células musculares e outros tipos de células. As fibras desse tipo de colágeno apresentam certa elasticidade e, por isso, são sempre encontradas em órgãos de forma variável, como intestino, útero e nas artérias.
O colágeno IV é formado por moléculas de colágeno que não se associam em fibrilas, mas prendem-se umas às outras pelas extremidades, formando uma rede. Se associa a várias moléculas não fibrosas da matriz extracelular e forma uma membrana contínua que separa certos tecidos. Em certas regiões desempenha o papel de filtro. É produzido pelas células epiteliais, musculares e pelas células dos capilares sanguíneos.
A partir do colágeno tipo I, é possível obter colágeno parcialmente hidrolisado (gelatina) ecolágeno hidrolisado, através dos processos de hidrólise ácida ou alcalina e por hidrólise química e enzimática sob condições controladas, respectivamente. A diferença entre o colágeno hidrolisado e a gelatina é que o colágeno hidrolisado se dissolve em água ou salmoura e a grande maioria não apresenta capacidade de gelificação.
A partir do colágeno hidrolisado é possível, ainda, obter peptídeos de colágeno, através da adição de enzimas de forma controlada e específica, que padroniza o seu tamanho molecular em peptídeos. A diferença entre peptídeos de colágeno e colágeno hidrolisado é basicamente o tamanho de cada molécula, que é menor no caso dos peptídeos, e a uniformidade do tamanho desses peptídeos, o que facilita a absorção e seu consequente aproveitamento pelo organismo.
O colágeno tem se mostrado um ingrediente importante nas indústrias de alimentos e bebidas. É usado principalmente na forma de fibra de colágeno e tem sido aplicado como suplemento dietético de proteína, transportadores no processamento de carnes, filmes e revestimentos comestíveis de produtos e aditivos alimentícios para melhorar a qualidade dos produtos. Além disso, o colágeno pode aumentar o valor nutricional e de saúde dos produtos.
Os benefícios do colágeno associados à saúde levou ao estabelecimento da indústria de suplementos de colágeno. Devido as características de absorção de umidade, o colágeno e suas frações têm mostrado uma função importante como valiosas fibras nutritivas e fonte de proteína na composição de dietas humanas.
O colágeno protege a pele, cabelos, unhas e tecidos corporais do envelhecimento natural. Os metabólitos do colágeno agregam osso, pele e ligamentos, atraindo fibroblastos que geram a síntese do novo colágeno. Desenvolve o diâmetro das fibrilas de colágeno na derme e a coesão das fibras de colágeno dérmicas. Portanto, a espessura, flexibilidade e resiliência, bem como a hidratação dos tecidos são aumentadas. Os nutricosméticos são geralmente oferecidos na forma de líquidos, comprimidos ou alimentos funcionais.
O suplemento de colágeno também é muito utilizado no campo da nutrição esportiva, promovendo o aumento do ganho de massa muscular magra, diminuindo o tempo de recuperação, reconstruindo a estrutura articular danificada e melhorando o desempenho cardiovascular. Esses benefícios são atribuídos a promoção da creatina natural do colágeno, um aminoácido essencial no novo crescimento muscular após exercícios.
O suplemento com colágeno tipo II é eficiente no tratamento da artrite reumatoide, doença inflamatória crônica caracterizada por dor, inchaço e rigidez de múltiplas articulações, promovendo a redução significativa na dor, rigidez matinal, contagem de articulações doloridas e contagem de articulações inchadas. A suplementação com colágeno também é indicada para prevenção e alívio dos sintomas de artrose e osteoporose.
O colágeno hidrolisado possui uma ampla gama de aplicações como aditivo alimentício, devido as suas propriedades de baixa viscosidade em soluções aquosas, odor neutro, incolor, transparência, emulsificação e estabilização, formação de espuma, formação de filme, molhabilidade, solubilidade, dispersibilidade, compressibilidade do pó, transportador de substâncias de baixa alergenicidade, bem como atividade antioxidante e antimicrobiana. É amplamente utilizado como ingrediente funcional na indústria de alimentos para aumentar a retenção de água em produtos à base de carne, desenvolvimento sensorial e melhoria das propriedades físicas e químicas em bebidas e laticínios.
Os hidrolisados de colágeno podem fixar íons de cálcio, melhorando sua biodisponibilidade, portanto, o colágeno hidrolisado pode ser usado como ingrediente funcional em alimentos no tratamento de deficiências minerais. Também atuam como anticoagulante, ajudando a diminuir os danos nas células e tecidos originados por baixas temperaturas; portanto, pode ser útil em alimentos que requerem armazenamento em temperaturas frias ou congelantes.
O colágeno hidrolisado tem sido utilizado na preparação de diferentes produtos, como os à base de carne, bebidas e sopas, entre outros, onde ajuda a aumentar e manter as propriedades sensoriais, químicas e físicas dos produtos alimentícios.
Os produtos à base de carne contendo matéria-prima adicionada de colágeno ou suas frações podem melhorar suas propriedades tecnológicas e reológicas. A adição de colágeno à pasta de fígado, por exemplo, melhora a qualidade dos produtos e reduz a taxa de ocorrência de tamponamento de gordura. Em alimentos processados, como salsichas, tem sido usado para substituir a gordura de porco com um nível de reposição de 50%. Os resultados do produto final apresentam maior capacidade de retenção de água, melhor estabilidade após o cozimento e textura melhorada, como dureza e mastigação.
O uso de colágeno hidrolisado de peixe em produtos à base de carne apresenta maior teor de proteínas, menor teor de gordura, aceitabilidade sensorial semelhante e melhor textura em comparação com os produtos sem colágeno hidrolisado. Já o colágeno hidrolisado da pele bovina pode ser utilizado em combinação com amido modificado e goma guar na elaboração de presunto.
No setor de bebidas, a tripla estrutura de hélice do colágeno é termicamente lábil e desempenha uma função significativa como agente clarificador em bebidas alcoólicas turvas por agregação de levedura e outras partículas insolúveis. As soluções de colágeno bovino se mostraram positivas no refinamento de cervejas e preparações de leveduras por modificação química.
O colágeno hidrolisado de peixe também pode ser adicionado em bebidas, como suco de laranja, por exemplo, apresentando melhora nas propriedades nutricionais e funcionais com maior teor de proteínas, biodisponibilidade e baixa viscosidade, além de alta solubilidade na água. Em bebidas lácteas fermentadas, a adição de colágeno hidrolisado como ingrediente funcional apresenta baixa sinérese e sedimentação, com boas propriedades físico-químicas e microbiológicas, além de afetar positivamente a viscosidade.
Atualmente, as bebidas com infusão de colágeno são uma tendência no mercado global e estão disponíveis em formulações que incluem colágeno de soja, colágeno de cacau, colágeno de cappuccino, suco com colágeno, entre outras.
A fibra de colágeno é outro ingrediente de interesse para a indústria de alimentos e bebidas. Obtida a partir do colágeno em sua forma bruta, estabilizada termicamente é uma alternativa natural para os emulsificantes sintéticos, principalmente em produtos ácidos, sendo usada em formulações de alimentos, tais como produtos de confeitaria e refrigerantes. A fibra de colágeno estabilizada ao calor pode ser uma alternativa natural aos emulsificantes sintéticos para uso em formulações ácidas de alimentos e bebidas.
Da mesma forma, os peptídeos de colágeno são ingredientes funcionais de fácil aplicação na indústria alimentícia. Estes compostos polímeros, que apresentam de oito a nove aminoácidos essenciais, são de grande importância para a engenharia de alimentos, pois além de oferecem amplos benefícios à saúde, são versáteis para inclusão em produtos alimentícios.
Devido a sua alta digestibilidade, rápida dispersão e solubilidade instantânea, o colágeno pode ser incorporado a uma multiplicidade de alimentos e está presente em uma multiplicidade de aplicações, como barras de cereais, para a redução do teor de açúcar, iogurtes para a redução do teor de gordura, sorvetes para conferir uma maior cremosidade, reduzindo a formação de cristais de gelo, nos shakes para o enriquecimento proteico, nos chocolates para a redução de gordura e em bebidas para a clarificação e também enriquecimento proteico das mesmas, como tripa reconstituída para embutidos e como agente estabilizador em emulsões cárneas. O colágeno também pode ser encontrado em bebidas funcionais, complexos vitamínicos, cápsulas e gomas. Há, ainda, a sua versão em pó, que pode ser misturada em sucos e shakes, entre muitas outras aplicações.
O colágeno também pode ser utilizado como filme e/ou revestimento comestível, tendo como principal aplicação a proteção contra a migração de oxigênio, umidade e solutos, proporcionando integridade estrutural e permeabilidade ao vapor aos produtos alimentícios. Além disso, os filmes comestíveis em produtos alimentícios têm grande perspectiva de prolongar a vida útil dos alimentos.
Na forma de filme ou revestimento, o colágeno também pode funcionar como transportador de substâncias ativas, como antioxidantes, antimicrobianos, corantes e sabores.
Márcia Fani
Editora