A inovação na indústria de ingredientes ganha cada vez mais espaço, alinhando tecnologias com o desejo dos consumidores por produtos diferenciados que atendam às necessidades atuais do mercado. Para falar sobre as formas de inovação na indústria de ingredientes, Aditivos | Ingredientes entrevistou, com exclusividade, Maria Teresa Bertoldo, pesquisadora do ITAL - Instituto de tecnologia de Alimentos.
A pandemia impactou o consumidor de várias formas e, consequentemente, promoveu uma transformação na indústria de alimentos e de ingredientes. Quais foram as principais transformações que o consumidor impôs à essas indústrias?
Diante da necessidade do isolamento social, as pessoas passaram a ter mais consciência da importância do meio ambiente e da relação da alimentação com a saúde. Houve o fortalecimento do conceito de um estilo de vida mais saudável e a procura de cardápios mais nutritivos, naturais e funcionais. Os consumidores passaram a procurar por alimentos saudáveis-funcionais, que pudessem auxiliar positivamente na resposta imunológica e atividade cerebral. Outro aspecto importante foi a da praticidade, uma vez que as pessoas passaram a trabalhar, estudar em casa e, assim, ter que preparar a sua alimentação ou a da família. As indústrias que acompanham as demandas no mercado procuraram se atualizar, tanto do ponto de vista da comunicação social como em diversificar seus produtos. O longo período de isolamento social e mudanças no estilo de vida do consumidor certamente refletiu em transformações do setor de alimentos.
Qual o novo perfil do consumidor de alimentos hoje? Como a indústria alimentícia assimilou esse novo perfil?
O consumidor demonstra uma visão mais holística do processo de produção, dando preferência por empresas idôneas, que através dos meios de comunicação conseguem demonstrar que são éticas, com responsabilidade social, preocupadas com a sustentabilidade do meio ambiente e mostram rastreabilidade dos ingredientes de seus produtos ao consumidor.
Grande parte das indústrias de alimentos tem conhecimento deste perfil e realizado investimentos tanto no sentido de melhorar os seus processos, como fazer esta comunicação através da mídia social.
O que essa transformação trouxe de inovação para a indústria de ingredientes e, consequentemente, para a indústria de alimentos?
A maior inovação foi a busca por ingredientes nacionais e principalmente os derivados de proteínas vegetais. No mundo todo, ocorreu uma grande expansão da população flexitariana e vegana, reduzindo ou excluindo a proteína animal do cardápio. Sem falar da preocupação com a sustentabilidade ambiental e conforto animal; a reflexão sobre a incidência de viroses e outras doenças, causadas pelo contato (direto ou indireto) ou consumo de proteínas de origem contribuiu sem dúvida para esse grande deslocamento nos hábitos alimentares.
Quais os desafios e as oportunidades para a indústria de ingredientes atreladas a essa nova demanda dos consumidores?
As indústrias passaram a buscar novas fontes de proteínas vegetais, para o desenvolvimento de novos produtos plant-based similares ou análogos aos produtos ou preparações cárneas. Portanto, existe um nicho de mercado cada vez mais crescente para o consumo de produtos elaborados exclusivamente de ingredientes vegetais.
Quais os processos de inovação para o mercado de ingredientes?
Desenvolver ingredientes de funcionalidade tecnológica a partir de fontes vegetais de cultivares brasileiras, ressaltando as características de naturalidade e saúde.
Como a tecnologia de alimentos pode ser aliada dos processos de inovação na indústria de ingredientes?
A tecnologia de alimentos é extremamente importante para desenvolver processos inovadores em substituição aos tradicionalmente aplicados. Substituir tecnologias que utilizam métodos físicos, evitando o uso de reagentes químicos e condições extremas que levem a perda dos componentes bioativos, naturais da matéria-prima ou, ainda, incorporem derivados químicos indesejados. Aqui podemos citar como inovadores os processos biotecnológicos, métodos de extração a frio, uso de membranas de separação, fluido supercrítico, ultrassom, ultra pressão hidrostática, os quais são consideradas metodologias emergentes.
Qual a importância do P&D da indústria de ingredientes para acelerar o desenvolvimento dos produtos alimentícios?
O P&D se faz importante quando consegue captar e entregar para o mercado produtos que refletem os anseios do consumidor. São extremamente relevantes no desenvolvimento de ingredientes que permitam a construção de alimentos com menor conteúdo calórico, mais naturais, maior conteúdo de antioxidantes, vitaminas, ausentes ou menor uso de proteínas de origem animal e assim tornar realidade as tendências apontadas pelo mercado consumidor.
No momento atual, qual a importância da inovação na indústria de ingredientes? Qual o caminho para inovar nesse mercado?
A inovação faz uma repaginação na indústria, traçando uma linha ascendente de inserção no mercado ou nichos de mercado com possibilidade de ampliação do seu portfólio de produtos. Os ingredientes inovadores se consolidam a partir da leitura dinâmica das necessidades e desejos do mercado consumidor. Aqui podemos considerar também os nichos de mercado, onde muitas vezes a oferta de produtos diferenciados é muito reduzida.
Em resposta às demandas dos consumidores, a indústria de alimentos está inovando no uso de ingredientes. O que podemos esperar para os próximos anos com relação a inovação de ingredientes alimentícios?
Percebo que a indústria de alimentos está buscando inovações na linha de ingredientes saudáveis, de produção nacional e com funcionalidade, tanto do ponto de vista nutricional como tecnológico, para aplicação em seus produtos. Contudo, o mercado de ingredientes precisa investir nos programas de P&D para achar soluções adequadas para as diferentes aplicações da indústria de alimentos. Sabemos que todo desenvolvimento exige um investimento, tanto do ponto de vista técnico-científico, como de investimentos de capital.
Como o ITAL pode auxiliar a indústria de ingredientes no caminho para a inovação?
O Brasil é um país continental de imensa biodiversidade vegetal, uma das maiores potências em produção agrícola e exportador de commodities. O ITAL pode contribuir com toda a sua capacidade técnico-científica e infraestrutura operacional para trabalhar ao lado da indústria de ingredientes, alimentos e bebidas na busca de soluções para inovações no setor.
Recentemente, foi aprovado pela Fapesp a formação e instalação no ITAL de um Núcleo de Pesquisas Orientado a Problemas do Estado de São Paulo (NPOP), denominado Plataforma Biotecnológica de Ingredientes Saudáveis (PBIS), que tem por objetivo inovar em ingredientes saudáveis. O Núcleo PBIS é composto por uma associação entre o governo do estado de São Paulo (Fapesp), ITAL (SAA/Apta), universidades (USP, Unicamp, Unesp)]e 10 empresas do setor para um trabalho pioneiro no Brasil. Ao longo de cinco anos serão entregues ingredientes genuinamente brasileiros, através do uso de tecnologias de última geração, para desenvolvimento de produtos inovadores para o mercado de ingredientes.
Considero a instalação do PBIS no ITAL um exemplo da sua contribuição no caminho da inovação, assim como a consolidação dos esforços realizados ao longo da sua existência, acompanhando a indústria de alimentos.