A principal característica de um emulsificante é que a sua estrutura é composta por uma parte hidrofílica, que interage com a fase aquosa, e outra lipofílica, que interage com a fase oleosa; essa estrutura permite a sua atuação na interface de duas substâncias imiscíveis. Para esta aplicação em especial, torna-se imprescindível o correto balanço entre a hidrofilicidade e a lipofilicidade da molécula do emulsificante. Quanto maior o valor de lipofilicidade, maior a hidrofilicidade e, quanto menor o valor de hidrofobicidade, maior a lipofilicidade. Dependendo desse balanço, o emulsificante poderá ser usado em emulsões do tipo água em óleo ou óleo em água.
A parte lipofílica é caracterizada pela presença de uma ou mais cadeias de ácidos graxos nas estruturas químicas. Por outro lado, a parte hidrofílica pode corresponder a uma variedade de grupos funcionais, dentre eles, o agrupamento OH, que pode ser visto nas moléculas de ésteres de sorbitano e de ésteres graxos de sacarose, e o agrupamento fosfatídeo nas moléculas dos fosfolipídios, como a lecitina. De acordo com o tipo de grupo polar presente, o emulsificante pode ser classificado em aniônico, catiônico, anfótero e não iônico.
A seleção do emulsificante é baseada nas características do produto final, na metodologia de preparação da emulsão, na quantidade de emulsificante adicionada, nas características químicas e físicas de cada fase e na presença de outros componentes funcionais na emulsão.
Os emulsificantes são aditivos empregados com diversas finalidades e funcionalidades na produção dos alimentos industrializados, destacando-se entre elas, melhorar a textura, o volume, a aeração e a homogeneidade dos produtos.
Além da sua usual atuação na estabilização de emulsões, os emulsificantes possuem a funcionalidade de modificador o processo de cristalização de óleos e gorduras. Produtos como chocolates, margarinas e sorvetes são elaborados com base nos compostos gordurosos que ao atingirem a condição de super resfriamento ou supersaturação, formam cristais e, posteriormente, uma rede cristalina tridimensional, responsável pelos atributos sensoriais dos produtos. Os emulsificantes podem interferir no tempo de indução e na velocidade de formação dos cristais de gordura, além de modificarem a morfologia e o hábito cristalino desses cristais, retardando as transições polimórficas indesejáveis e afetando diretamente a qualidade dos produtos.
O comportamento de cristalização dos óleos e das gorduras influencia na estabilidade física dos produtos de base gordurosa no que se refere a exsudação do óleo, a coalescência de glóbulos de gordura em emulsões, a formação e a sedimentação de cristais em um óleo. Portanto, o entendimento do processo de cristalização de gorduras é fundamental para que a gordura cumpra eficientemente o seu papel no produto final, garantindo sua qualidade.
A cristalização de um sistema no estado líquido ocorre quando se atinge o estado de supersaturação, em que as moléculas se unem para formar núcleos estáveis. Após a formação desses núcleos, ocorre a etapa de crescimento dos cristais, que se prolonga até o sistema atingir o equilíbrio termodinâmico. A combinação da nucleação e do crescimento dos cristais possibilita a formação de uma rede contínua de cristais, responsável pelas propriedades macroscópicas e mecânicas de uma gordura.
Os cristais podem se apresentar em distintas formas polimórficas, denominadas de α, β´e β. Essas formas são baseadas nas estruturas de subcélulas oriundas do empacotamento das cadeias alifáticas das moléculas dos triacilgliceróis, presentes nos óleos e nas gorduras. Uma forma polimórfica menos estável, como a forma α, pode ser convertida na forma de estabilidade intermediária β´, e está para a forma mais estável β, sem ocasionar qualquer mudança na estrutura química dos cristais. Em margarinas e em shortenings, por exemplo, podem existir duas formas polimórficas, β´e β, sendo os cristais com a forma β´ os desejáveis para esses tipos de produtos por serem relativamente pequenos, por incorporarem uma grande quantidade de matéria graxa líquida na rede cristalina, proporcionando ao produto final uma superfície brilhante, textura lisa sem granulosidade e com boa espalhabilidade. Outro exemplo, é a manteiga de cacau, onde o comportamento polimórfico é complexo. Essa matéria-prima se cristaliza em seis formas polimórficas, identificadas comumente como I, II, III, IV, V e VI, sendo a forma VI a mais estável; aforma V, ou comumente denominada como βV, é a desejada para os chocolates, sendo produzida na etapa de temperagem.
Durante o processo de cristalização, a interação entre as moléculas dos emulsificantes e dos triacilgliceróis ocorre de acordo com a miscibilidade entre eles, podendo ocorrer na forma de miscibilidade limitada, quando o emulsificante age como impureza, podendo promover ou retardar o crescimento dos cristais e as transições polimórficas; e alta miscibilidade ou total imiscibilidade, em que o emulsificante age como gérmen de cristalização, favorecendo a nucleação. Outra forma considerada é que os triacilgliceróis e os emulsificantes seriam capazes de cocristalizarem, devido à similaridade das suas estruturas químicas. Em geral, quanto maior a dissimilaridade entre eles e quanto maior a massa molar do emulsificante, maior o seu potencial inibidor no processo de cristalização.
Os emulsificantes apresentam diferentes funcionalidades, sendo a mais conhecida a aeração.
A aeração e a manutenção da espuma formada são importantes propriedades em produtos nos quais se deseja ganho de volume, devido a incorporação de ar durante o processamento. A espuma é formada através da incorporação de ar em um sistema alimentício contendo água. Quando se adiciona um emulsificante a um sistema com água, este satura a superfície do líquido até a tensão superficial ser reduzida a um valor muito baixo. A partir disso, a penetração de bolhas de ar no líquido, através da agitação, é facilitada, garantindo, assim, uma maior aeração interna. As moléculas do emulsificante presente dentro do líquido têm sua porção lipofílica orientada para as bolhas de ar e a porção hidrofílica orientada externamente para o meio contínuo, que é a água. Isso permite a estabilização da espuma formada, garantindo maior aeração interna do produto.
Outra importante função dos emulsificantes é a sua utilização como blends, muito comuns na indústria alimentícia. Esse processo consiste no uso de dois ou três componentes emulsificantes para alcançar funcionalidades múltiplas. Em uma emulsão de bolo, por exemplo, a aeração para produzir alto volume, estabilização de espuma, maciez e retenção de umidade, são alcançadas usando uma mistura de emulsificantes. Para otimizar os blends, é recomendado usar a técnica de experimentação fatorial total, utilizando um nível básico ou, até mesmo, zero de cada emulsificante e outro nível mais alto de cada emulsificante. A vantagem de se utilizar esse método está na detecção de dois ou três fatores de interações que não são incomuns em sistemas alimentícios complexos.
Além da sua função principal, que é produzir e estabilizar emulsões, os emulsificantes alimentícios contribuem em numerosos outros papéis funcionais, como por exemplo, melhorar a textura e shelf life de produtos contento amido; formar complexos com os componentes destes; modificar as propriedades reológicas da farinha de trigo, pela interação com o glúten; melhorar a consistência e textura de produtos à base de gorduras, pelo controle de polimorfismo e da estrutura cristalina das gorduras; além de promover a solubilização de aromas. Exemplos de alimentos processados que são emulsões incluem creme de leite, manteiga, margarina, maionese, molhos para salada, salsicha, linguiça, sorvetes, bolos, chocolate, recheios e produtos instantâneos.
Frequentemente, os emulsificantes naturais e comerciais são misturas complexas que variam em composição entre diferentes fabricantes. Outros ingredientes alimentícios, como proteínas e particulados, contribuem para a atividade de superfície e podem alterar dramaticamente o caráter da emulsão.
Em alguns produtos, os emulsificantes desempenham papel específico e de grande importância, como por exemplo, no setor de panificação, onde podem funcionar como condicionadores de massa. Além do pão, outros diferentes tipos de produtos de panificação produzidos por métodos convencionais se beneficiam da adição de emulsificantes, incluindo o pão branco produzido por processo altamente mecanizado, pãezinhos, pães doces, pães fermentados e donuts. Alguns emulsificantes também atuam como amaciantes de migalhas.
Outra aplicação dos emulsificantes é na fabricação de bolos, cujas três funções principais desempenhadas são facilitar a incorporação de ar; dispersar a gordura em partículas menores para permitir o número máximo de células de ar; e melhorar a retenção de umidade. A utilização em bolos exemplifica um dos efeitos mais conhecidos dos emulsificantes, que é a propriedade de promover a aeração da massa, o que tem influência de maneira direta no volume do bolo, em razão da formação e estabilização da espuma.
A adição do emulsificante apropriado também pode melhorar as características dos biscoitos, como volume, superioridade do grão e, particularmente, a taxa de distribuição.
Em produtos doces, a eliminação do bloom, ou seja, a transição de cristais de gordura da configuração alfa e beta para a configuração beta, menos desejável, é uma razão chave para a adição de emulsificantes, os quais podem ser usados, também, como modificadores da estrutura do cristal em misturas de triglicerídeos e para controlar a viscosidade do produto em recheios de creme e em chocolates.
Uma das maiores áreas de aplicação dos emulsificantes é na fabricação de sorvetes, onde são vitais na formação de estruturas lipídicas apropriadas e para assegurar uma distribuição de ar necessária para garantir uma textura macia ao paladar, assim como boas características de derretimento. Essa característica é alcançada através da desestabilização promovida pelo emulsificante na emulsão de gordura, levando a um produto macio e seco, que derrete com a uniformidade e velocidade desejadas.