Além da soja e da ervilha: as novas perspectivas das proteínas vegetais
O mercado global de proteínas vegetais vive uma era de transformação. Com projeção de crescimento anual de 7,4% até 2030, segundo relatório da Grand View Research, a demanda por alternativas proteicas de origem vegetal tem impulsionado inovações no setor de ingredientes e aditivos alimentares. No entanto, embora a soja e a ervilha tradicionalmente dominem esse cenário, novas fontes também surgem com alto potencial para reformular portfólios e expandir oportunidades comerciais.
Proteínas vegetais: mercado e potencial de expansão
O aumento da procura por proteínas vegetais vai além da substituição da carne em dietas vegetarianas ou veganas. Esse movimento reflete mudanças mais profundas no comportamento do consumidor e nas estratégias industriais, impulsionadas pela preocupação com sustentabilidade e segurança alimentar.
A virada para as proteínas vegetais começou a ganhar força a partir da década de 2010, acompanhada pela ascensão do conceito de "plant-based" e por marcas dedicadas exclusivamente a esse segmento que surgiram à época. Essa transformação abriu espaço para pesquisas em novas fontes proteicas, gerando um movimento global.
De acordo com a Bloomberg Intelligence, o mercado de proteínas alternativas, que inclui as vegetais, pode chegar a cerca de 162 bilhões de dólares até 2030, representando 7,7% do mercado global de proteínas. Mercados na Europa e na América do Norte lideram esse crescimento, com forte adesão de consumidores preocupados com a redução do impacto ambiental. Em paralelo, países da Ásia estão acelerando investimentos em biotecnologia para desenvolver proteínas vegetais locais, enquanto a América Latina se destaca como fornecedora de matérias-primas.
Algumas empresas já apostam em diversificar o portfólio com opções de proteínas vegetais não alergênicas, como a Gramkow, que para isso explora alternativas como arroz, girassol e alfarroba. A variedade, segundo a própria empresa, é o que permite ser flexível e se adaptar ao mercado atual sem perder qualidade e diferenciação nos produtos.
Tecnologia
Tantas mudanças também exigem tecnologias ainda mais aprimoradas para desenvolver soluções que atendam às exigências da indústria e dos consumidores. Confira algumas das principais inovações tecnológicas que estão liderando esse novo momento na produção de proteínas vegetais:
FERMENTAÇÃO DE PRECISÃO
Utilizada para programar microrganismos a fim de produzir proteínas específicas, com alta pureza e menor impacto ambiental. Essa técnica permite a produção em grande escala de proteínas idênticas às encontradas em animais, mas de forma completamente vegetal.
CULTIVO CELULAR
Originalmente associado à carne cultivada, o cultivo celular começa a ser explorado também para proteínas vegetais. A técnica permite a reprodução de células vegetais em ambiente controlado, gerando proteínas de alta qualidade sem a necessidade de cultivo agrícola tradicional, economizando recursos hídricos e reduzindo o uso de pesticidas.
ISOLAMENTO PROTEICO AVANÇADO
Novas técnicas de extração, como eletrodiálise e filtração por membranas de alta precisão, estão otimizando o isolamento de proteínas vegetais, aumentando a concentração proteica e melhorando as propriedades funcionais para aplicações industriais.
TECNOLOGIA DE EXTRUSÃO A FRIO
Diferente da extrusão tradicional, essa técnica permite criar texturas mais próximas da carne, sem degradação proteica. É uma solução promissora para análogos de carne à base de plantas, aumentando a aceitação do consumidor.
Principais fontes emergentes de proteínas vegetais
1. Proteína de Grão de Bico
Atualmente, o grão de bico é um dos principais ingredientes para produtos plant-based devido ao seu perfil nutricional equilibrado e sabor neutro. Com cerca de 19g de proteína por 100g, ele também oferece um alto teor de fibras e minerais, sendo ideal para aplicações em snacks, massas e análogos de carne.
2. Proteína de Lentilha
Com aproximadamente 25g de proteína por 100g, a lentilha destaca-se pela alta densidade nutricional e riqueza em ferro e fibras. Na indústria, tem sido utilizada em produtos de conveniência, como sopas instantâneas e barras proteicas. A expansão do mercado europeu para análogos de carne à base de lentilha é um indicador de sua aceitação e potencial de crescimento.
3. Proteína de Amêndoa
Embora com custo elevado, a proteína de amêndoa é valorizada em segmentos premium, como nutrição esportiva e bebidas vegetais. Além de fornecer 20g de proteína por 100g, ela se destaca pela textura cremosa e sabor suave, facilitando sua aplicação em produtos de alto valor agregado.
4. Proteína de Semente de Abóbora
A proteína de semente de abóbora é uma das opções mais sustentáveis, aproveitando subprodutos da indústria de óleos vegetais. Com 30g de proteína por 100g, é rica em minerais como zinco e magnésio, oferecendo um diferencial competitivo para produtos funcionais. Além disso, possui boa digestibilidade e propriedades emulsificantes, ampliando suas aplicações industriais.
5. Proteína de Cânhamo
Com um perfil de aminoácidos completo, a proteína de cânhamo entrega 32g de proteína por 100g, sendo altamente biodisponível. Seu cultivo exige baixa quantidade de água e é resistente a pragas, tornando-se uma opção sustentável e de alta produtividade.
6. Proteína de Microalgas
A produção de proteínas a partir de microalgas representa uma fronteira tecnológica no setor de alimentos. Além de fornecer todos os aminoácidos essenciais, as microalgas possuem ácidos graxos ômega-3, fibras e antioxidantes. Cultivadas em biorreatores, sua produção é escalável e independente de solo arável.
Oportunidades em meio aos desafios
O crescimento no setor de proteínas vegetais não o torna imune a desafios, afinal, a viabilidade comercial ainda favorece a proteína de ervilha, devido à sua alta concentração natural de proteínas, ampla disponibilidade no mercado e custo mais competitivo em relação às demais fontes.
O custo de produção, inclusive, é um dos desafios principais, uma vez que as tecnologias de extração, isolamento e texturização de proteínas vegetais demandam altos investimentos, sobretudo em infraestrutura e P&D (Pesquisa e Desenvolvimento). A implementação de métodos como fermentação de precisão e extrusão a frio, apesar dos benefícios em qualidade e sustentabilidade, ainda tem custos elevados que impactam diretamente no preço final dos produtos. Superar isso exige escalabilidade industrial e otimização de processos para reduzir custos operacionais sem comprometer a qualidade.
A produção em grande escala também se torna desafiadora, principalmente no caso de proteínas emergentes, como as de microalgas e cânhamo. Além disso, questões logísticas e de armazenamento, aliadas à dependência de tecnologias como biorreatores de alta capacidade, tornam a expansão comercial um processo complexo. Para superar essa barreira, as empresas estão investindo em técnicas de otimização da cadeia produtiva e em parcerias estratégicas para ampliação da capacidade industrial.
A aceitação do consumidor não pode ser esquecida. Um dos principais obstáculos para a aceitação em massa das proteínas vegetais é a capacidade de replicar sabor, textura e aroma de produtos de origem animal. Tecnologias como encapsulamento de sabor, engenharia enzimática e uso de biotecnologia avançada têm sido exploradas para aprimorar essas características, mas ainda precisando superar questões com o custo, citado anteriormente.
Por outro lado, a inovação contínua, aliada a investimentos em P&D e parcerias estratégicas, tem o potencial de transformar esses desafios em oportunidades. Empresas que apostarem em tecnologias de fermentação, melhorias nos processos de extração e otimização da cadeia produtiva estarão mais bem posicionadas para atender a um mercado em rápida expansão.



